Para discutir se o jornalismo em tempos de redações informatizadas é ou não um estilo literário, profissionais da mídia e escritores vêm se encontrando às quintas-feiras na Academia Brasileira de Letras (ABL), centro do Rio de Janeiro, no Seminário de Jornalismo e Literatura. Foi o jornalista, publicitário, empresário e escritor ocasional Mauro Salles quem idealizou o encontro, reunindo na ABL estudantes, acadêmicos e aspirantes a escritores e poetas. Afinal, o jornalismo é ou não um estilo literário? Até que ponto se funde com o mundo da literatura? Não é de hoje que a discussão se estende. “O jornalista é um peixinho colorido de aquário, tem de agradar, ser lido, senão perde o emprego. Sua obra é datada, temporal. Já o escritor é um ser que abriga águas profundas, fica escondido lá no fundo e pode passar anos sem ser reconhecido ou mesmo lido.” A comparação é do dono da cadeira nº 3 da ABL, o jornalista e escritor Carlos Heitor Cony, autor de livros consagrados, para quem o jornalismo não é um estilo literário.

O também jornalista e escritor Cícero Sandroni, que ocupa a cadeira nº 6, discorda de Cony. “Os sertões, de Euclides da Cunha, é uma das maiores obras da literatura brasileira e, ao mesmo tempo, uma reportagem irretocável sobre a guerra de Canudos”, analisa. Luiz Paulo Horta, crítico de música erudita do jornal O Globo, ressalta que a grande literatura é fonte permanente de inspiração para o jornalismo. Já a romancista, contista e jornalista Nélida Piñon, dona da cadeira de nº 30, admite que o ofício do escritor é mentir ao criar heróis mesquinhos e sublimes, enquanto o do jornalista é ser um catador de notícias.

José Nêumanne, crítico do Jornal da Tarde, num dos encontros escolheu um tema mais ácido: a decadência do jornalismo cultural. “Execro a moda populista dos que falam numa língua portuguesa e condenam os cânones gramaticais como se eles fossem um preciosismo elitista. Conclamo os presentes a tentarem preservar a língua dentro dos cânones para não cairmos numa babel de incomunicação total”, provocou o jornalista, dividindo as atenções com o filólogo Evanildo Bechara e o poeta imortal Ivan Junqueira. “Como escritor, sou um beneficiário do jornalismo. A passagem pelo jornalismo me fez mais objetivo, econômico e aprendi a não amolar os leitores”, reconheceu Junqueira. O premiado autor francês Pierre-Jean Rémy transitou durante anos pelos mundos da literatura e do jornalismo. Muitos de seus livros foram adaptados para a televisão e o cinema. Nas redações de jornais e revistas especializadas, atuou como crítico teatral, além de ter escrito crônicas sobre ópera e música lírica. Imortal da Academia Francesa, Rémy é a prova de que não só no Brasil jornalismo e literatura têm algo em comum.