Líderes com problemas políticos domésticos costumam apelar para eventos internacionais para distrair a patuléia e granjear lá fora o prestígio perdido em casa. Mas o rápido giro de George W. Bush pela Argentina e pelo Brasil, na seqüência da 4ª Cúpula das Américas, em Mar del Plata, além de expor o impasse das negociações sobre a Área de Livre Comércio das Américas (Alca) entre EUA, Mercosul e Venezuela, transformou-se em novo pretexto para uma miríade de ONGs e de figurinhas carimbadas do vasto espectro dos “antiglobalizantes” sair às ruas para manifestar sua ojeriza ao comandante do império e organizar uma cúpula paralela, a “Cúpula dos Povos”. Enquanto o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, levava a turba ao delírio com sua tentativa de fazer com que o evento enterrasse simbolicamente a Alca (“eu trouxe a minha pá”, disse), o ex-craque Diego Maradona preparava-se para se transformar em novo líder dos “descamisados”. De trem, no chamado Expresso del Alba (Área de Livre Comércio Bolivariana das Américas, a contraproposta chavista à Alca), o ex-jogador saiu de Buenos Aires na noite de quinta-feira 3 para participar dos protestos em Mar del Plata, a 400 quilômetros da capital. Com ele viajavam o líder cocaleiro boliviano Evo Morales – candidato a presidente da Bolívia e fonte de apreensões em Washington – e o cineasta bósnio Emir Kusturica. “Bush é um lixo humano”, tascou Dieguito, que dias atrás já tinha chamado o mandatário americano de “assassino”.

Tentando parecer simpático, Bush reconheceu que talvez fosse um convidado indesejado: “Quero agradecer-lhe por ser um bom anfitrião. Não é fácil receber os representantes de todos esses países, não sendo talvez particularmente fácil receber a mim”, disse ele na sexta-feira 4 ao presidente argentino, Néstor Kirchner. Fora do hotel onde se realizava a entrevista, Mar del Plata vivia sua nostalgia passadista, com manifestantes gritando slogans antiamericanos ao lado de pôsteres de Che, San Martín, Simón Bolívar e José Martí. Também foram vistos, juntos, retratos de Lula, Kirchner, Chávez, Tabaré Vázquez e Fidel Castro. Pelo menos na imaginação dos antiglobalistas, eles permaneciam unidos.