22/10/2003 - 10:00
Vai ser votada e aprovada na Câmara dos Deputados na semana que vem a melhor, mais profunda e mais eficiente reforma no sistema prisional brasileiro dos últimos 20 anos. Trata-se da alteração do artigo 112 da Lei de Execução Penal de 1984 (LEP). Segundo esse artigo, qualquer presidiário que esteja nos prazos de cumprimento da pena para pleitear os benefícios do regime semi-aberto e da liberdade condicional é submetido a laudos psicológicos e psiquiátricos que dirão se ele tem ou não o direito a esses benefícios. Detalhe: tais benefícios são previstos na objetividade da lei, e a subjetividade desses laudos são, na melhor das hipóteses, um constrangimento ilegal ao preso dentro do Estado Democrático de Direito. “Não se pode impor ao presidiário outra condição a não ser aquela imposta pela lei e pelo juiz”, disse com exclusividade a ISTOÉ o deputado Ibrahim Abi-Ackel, relator do projeto. “Vou mandá-lo à votação na semana que vem.” E ninguém mais isento do que ele para aconselhar e aprovar a mudança na LEP, uma vez que também é de sua autoria, quando ministro da Justiça, a própria redação da LEP. Assim que a Câmara aprovar o novo projeto, esses laudos estarão extintos. Ficará valendo a avaliação da direção da instituição prisional, que dirá se houve por parte do preso bom comportamento carcerário. Alguns pontos sobre o sepultamento do artigo 112 da LEP:
“Os laudos permitem uma avaliação subjetiva e o Direito determina uma avaliação objetiva da condição do sentenciado para a concessão de benefícios. Essa avaliação objetiva são os prazos de cumprimento da pena para a progressão do regime prisional”, disse a ISTOÉ o secretário da Administração Penitenciária do Estado de São Paulo, Nagashi Furukawa. O governador Geraldo Alckmin e Furukawa foram os grandes estimuladores desse novo projeto. “Não é ético o Estado se imiscuir nos patamares emocionais e psíquicos do presidiário, e é isso que os laudos significam. Eles se chocam com o Estado Democrático de Direito”, diz o ouvidor dessa secretaria, Pedro Armando Egydio de Carvalho.
Um detalhe igualmente importante é que não é maior o números de ex-presos que voltam a transgredir do que o número de pessoas que nunca foram presas e transgridem pela primeira vez. Isso mostra que os laudos, quando falam que um sentenciado não pode ir para a rua porque “é imaturo” ou apresenta “não cessação de periculosidade”, não estão a rigor mesurando absolutamente nada. A extinção dos laudos coloca assim o Brasil na contemporaneidade do mundo ao abolir o critério da periculosidade – e, assim, finalmente entende-se no Brasil a lógica do brasileiríssimo Machado de Assis em O alienista.