15/10/2003 - 10:00
Há atualmente no mundo 1,2 bilhão de adolescentes. São meninos e meninas entre dez e 19 anos. Somando esse público ao total de pessoas com menos de 25 anos, os jovens representam quase a metade dos habitantes do planeta. É o que mostra um relatório do Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA), divulgado na semana passada. Batizado de Situação da População Mundial 2003, o trabalho traz números assombrosos. Um deles revela que a cada 14 segundos um jovem é infectado pelo vírus da Aids, o HIV.
Ainda segundo o relatório, 42% dos novos casos da doença registrados no ano passado se referem a pessoas entre 15 e 24 anos. Abaixo dessa faixa etária, o índice é de 16%. A situação é grave principalmente nos países da África Subsaariana, também conhecida como África Negra. O Fundo, entidade ligada à Organização das Nações Unidas (ONU), chega a estimar que em Botsuana, no Zimbabue e na África do Sul 60% dos rapazes que hoje têm 15 anos poderão se infectar. Para os estudiosos do assunto, no entanto, a situação não é tão surpreendente. “Dos adolescentes do mundo, 87% vivem em países em desenvolvimento. Ao analisarmos as características atuais da epidemia, é natural se esperar que a Aids aumente nessa população”, afirma a americana Rosemary Madden, especialista em saúde pública e representante no Brasil do UNFPA. Ela se refere ao fato de a doença estar se espalhando entre os pobres e fora dos grandes centros urbanos. Ou seja, em regiões onde o acesso à informação é mais restrito.
O médico David Uip, professor de infectologia da Universidade de São Paulo, acrescenta que o início da vida sexual cada vez mais cedo ocupa papel importante nesse cenário. “As crianças entre 13 e 15 anos têm cuidados mínimos. Poucas pensam em usar preservativos”, explica. Ele não exagera na menção à idade. Com base em pesquisas feitas em diversos países, inclusive no Brasil, o relatório aponta que 25% dos adolescentes tiveram sua primeira relação antes dos 15 anos. O infectologista diz ainda que nesse grupo é comum a banalização da doença. “A garotada não viu as mortes do início da epidemia. E, além disso os jovens adotam uma posição de enfrentamento. Ouço no consultório gente dizendo que, como a doença tem tratamento, não precisa se preocupar”, conta.
Comportamento – Por aqui, o quadro de infecção na juventude é diferente, garante Alexandre Grangeiro, diretor do Programa Nacional
de DST/Aids. “No Brasil, os jovens respondem bem ao programa de prevenção. Eles são mais flexíveis à incorporação de hábitos do que
os adultos”, compara. Grangeiro assegura que a taxa de infecção entre
a garotada segue o padrão das demais faixas. Dados do Ministério da Saúde indicam que dos 600 mil casos registrados no País, 12% são
de pessoas entre 15 e 24 anos. Uma das razões disso é a cultura brasileira, menos conservadora do que muitas nações. “O Brasil sempre adotou uma política focalizada no uso da camisinha. Isso é tabu em alguns países”, argumenta.
Existe, entretanto, um ponto em comum entre a situação brasileira e a mundial. As meninas estão mais sujeitas ao perigo do que os meninos. O estudo do Fundo de População assegura que em países em desenvolvimento muitas mulheres não sabem como se proteger. Um dos exemplos é a Somália, onde somente 26% ouviram falar da enfermidade. No Brasil, o risco é maior entre as adolescentes. “De todos os grupos etários, o único em que há mais mulheres infectadas que homens é o de 13 a 19 anos”, completa Grangeiro.
Educação – Diante disso, os especialistas recomendam atenção especial ao jovem. Para Rosemary, a questão não envolve apenas a saúde. “É preciso resolver as disparidades sociais para que os adolescentes tenham educação, oportunidades, renda. Programas como Bolsa-Escola e Primeiro Emprego ajudam”, comenta. Uip aposta na educação continuada dos estudantes. “Temos de manter uma conversa franca e regular com as crianças”, emenda. O governo também investe na rede pública de ensino. Em agosto, criou o programa de Saúde em Sexualidade nas escolas. E também focará suas ações nos jovens na campanha “Fique Sabendo”, a ser lançada nos próximos dias. A proposta é estimular a população a fazer o teste de Aids. Afinal, calcula-se que 400 mil pessoas não têm idéia de que carregam
o vírus, como ISTOÉ revelou na edição 1774. “A respeito desse dado
não temos um recorte por faixa etária, porém vamos aproveitar que
o jovem é mais sensível ao programa para incentivá-lo a fazer o
exame”, afirma Grangeiro.