Depois de ter assistido aos recentes escândalos no Senado, que jogaram a classe política na vala do descrédito, o eleitor brasileiro vai exigir mais de seus candidatos nas próximas eleições. Esse é também um indicativo de que os marqueteiros vão ter que trabalhar dobrado. Especialistas ouvidos por ISTOÉ asseguram que o País quer um novo discurso, um novo marketing. Velhas formas, chavões e megashows não produzirão o efeito desejado junto ao eleitor. Não bastará ao concorrente o perfil de estadista, como foi utilizado pelo presidente Fernando Henrique na reeleição.

André Torreta, 36 anos, 15 deles no mercado publicitário, que tem no currículo campanhas de Roseana Sarney e Alceu Collares, entre outros, pergunta: “Qual o tipo de político que o Brasil passará a aceitar depois da Era FHC?” Segundo ele, após a volta da democracia verifica-se um quadro político evolutivo no qual a mídia desempenha um importante papel fiscalizador, capaz de gerar denúncias graves e atuar como fator depurador da classe política. “Há um cenário de crise e em toda a crise existe uma oportunidade de se lançar alguém. Em 1989 tivemos a campanha em que surgiu o personagem Fernando Collor, criado em meio a um vácuo político. Acredito que exista a oportunidade de se lançar alguém com idéias novas, uma nova imagem”, afirma.

Segundo Torreta, não adianta “vender” imagem de honestidade falsa para o eleitor. “Acabou o tempo da publicidade da invenção.” O publicitário rechaça a possibilidade da venda de milagres. Segundo ele, o marketing pode agregar ao discurso do candidato o seu programa de governo. “Temos muitos discursos e poucos projetos. Creio que a grande contribuição das pessoas que estão envolvidas com campanhas políticas é a de desvendar qual o projeto para o Brasil. Discute-se política pela política.” Para o publicitário, indicar um candidato para alguém era mais fácil do que hoje. Nos últimos dez anos, mais de 40 milhões de televisores foram vendidos no Brasil. “O formador de opinião não existe mais. Graças ao rádio e à tevê as classes C e D estão informadas, se bem ou mal informadas já é outra questão. Elas têm sua própria opinião.”

José Roberto Berni, da DM9DDB Institucional, 53 anos, é publicitário há 30. Já passou pelas campanhas de FHC para presidente, Jayme Lerner, Antônio Britto e Eduardo Azeredo para governador. Para Berni, um candidato não ganhará eleição afirmando somente pressupostos de que é honesto e ético. “Tem que haver carisma, empatia do eleitorado para poder passar a credibilidade que ele tem. A outra metade do caminho será apresentar suas propostas.” Ele lembra que Collor tinha, de forma muito convincente, a modernidade e a moralidade. “Já Fernando Henrique empunhou a bandeira do Real e depois a continuidade de uma coisa que deu certo. A meu ver estão faltando propostas nas atuais candidaturas à Presidência. As que existem me parecem vagas: ‘vamos manter a estabilidade, a justiça social’ ou o chavão ‘vamos diminuir as desigualdades sociais’. Mas não mostram como fazer isso. Estão no superficial, enquanto o povo quer sentir a consistência dessas propostas”, disse.

Arquétipos – Para Berni, será difícil substituir FHC. “O que está acontecendo no governo dele hoje vai contar, mas não será o principal”, assegura. O publicitário ressalta que o discurso de Ciro Gomes tem melhorado, mas o candidato do PPS patina na credibilidade. “O fato de ser nordestino pode levar seus adversários a uma comparação inevitável com Collor. Ele pode até responder bem a isso, mas existe a questão do arquétipo. Isso está no subconsciente dos eleitores. Em 1998, as pesquisas mostravam que a população queria ouvi-lo mais. Seu discurso atraía a atenção, mas persiste o paradoxo: o novo traz consigo o estigma do fracasso e a possibilidade de ser uma farsa”, afirmou.

Paulo de Tarso da Cunha Santos, 30 anos de profissão e marqueteiro de Lula em 1989 e 1994, ressalta que o amadurecimento do eleitor é consequência da prática das eleições. “Ele já descobriu nossos dribles. O caminho mais claro a ser percorrido é o da argumentação comprometida com a verdade. A glamourização da política faz parte da época tupiniquim do nosso marketing eleitoral. Está ultrapassada. Política para o brasileiro já é coisa séria.” Quanto ao marketing propriamente dito, Tarso acredita que o Brasil caminha para um mix entre o seu modelo e o americano. “Eles, na área de pesquisa de opinião pública, levantam a informação com uma precisão impressionante. Por outro lado, temos a criatividade, que talvez seja única no mundo pela característica da nossa legislação eleitoral. Mas contra nós pesa o fato de que nossos marqueteiros às vezes são pouco responsáveis, principalmente quando se colocam à frente das campanhas como personagem. Deveriam ser coadjuvantes”, adverte.

Ele acredita que o Brasil poderia criar um ranking de profissionais nessa área. Nos EUA, lembra, já existem escritórios especializados, que não são meras agências de propaganda. Existem, inclusive, publicações especializadas, como a Campaigns & Elections (Campanhas e eleições), que destacam os profissionais e suas campanhas, como foi o caso da edição que trouxe a reportagem Vencedores e perdedores de 2000. “Se fizermos isso, teremos grandes surpresas”, afirma. Sobre pesquisas, Tarso é contrário à divulgação de resultados às vésperas das eleições. “Nos países mais civilizados isso não ocorre. Pesquisas podem ser divulgadas, no máximo, até 15 dias antes do pleito. O voto é um instrumento democrático de suma importância, ou seja, o cidadão deve ir às urnas com ele amadurecido e não deve, portanto, ser influenciado na última hora por pesquisas que podem refletir situações circunstanciais”, conclui.