01/10/2003 - 10:00
São precisa ser rico como quem não é rico imagina. Quem dispõe de
R$ 100 por mês pode entrar na roda da Bolsa de Valores de São Paulo,
a Bovespa, a maior da América Latina. Os clubes de investimento estão prosperando e uma prova disso é o clube de mulheres da escola de Feng Shui, que reúne 32 investidoras de 23 anos, como Adriane, à dona Amélia, 73. Ninguém está queimando dinheiro. “É loucura vender um imóvel para fazer um investimento desse tipo”, diz Solange Ceraso, professora de informática e participante ativa do clube. “Mas não há dúvidas de que é bom diversificar, e essa é uma possibilidade bem interessante.” Solange sentiu um certo receio no começo da história. Bolsa sempre assusta aos leigos. Parece jogo de azar. Hoje ela é capaz de entender o porquê daquela desvairada gritaria no pregão, aquela confusão de papéis, aquele indecifrável mundo masculino. As mulheres
do clube Feng Shui estão investindo uma parcela de sua renda numa poupança de médio e longo prazos mais generosa em rendimentos do que a tradicional poupança, uma espécie de previdência privada – aquela que trabalhadores passam a vida sonhando em ter uma. A regra montada por elas com a ajuda da corretora Socopa diz que nos três primeiros meses
o investimento seria de R$ 500 por mês, para fazer “um colchão de sustentação”, caindo em seguida para R$ 100.
Cada clube tem seu estatuto social individual, que definirá algumas normas que devem ser seguidas para o seu bom funcionamento. Os clubes são registrados na Bovespa e a custódia das ações fica a cargo da Companhia Brasileira de Liquidação e Custódia (CBLC). É fácil entrar e é bom não sair na primeira subida (ou queda) das ações. Ninguém ganha dinheiro na Bolsa em alguns meses – nem Warren Buffett, um dos homens mais ricos do mundo que multiplicou sabe-se lá por quantas vezes sua fortuna nesse mercado Bolsa (sem investir um tostão no boom tecnológico). É um investimento de longo prazo – o que pode significar três, quatro anos –, que, cada vez mais, vem sendo estimulado com o projeto “Bovespa Vai até Você”, que já atingiu mais de 65 mil pessoas. O número de visitas ao site www.bovespa.com.br saltou de 370 mil em setembro – mês de lançamento do projeto – para mais de 600 mil atualmente. Em maio de 2003, esse número bateu recorde, atingindo 696 mil visitantes. Para informar ao maior número possível de brasileiros sobre o mercado de capitais, o projeto foi dividido em programas como “Bovespa Vai à Fábrica”, “Bovespa Vai à Universidade”, “Bovespa Vai às Academias de Tênis”, “Bovespa Vai aos Clubes”, “Bovespa Vai à Praia”, entre outros. O projeto de popularização do mercado de ações contempla também o “Delivery”, programa que conta com o suporte de uma van equipada com terminais de computador e equipe de profissionais treinados que se desloca para o atendimento a grupos específicos.
Foi numa dessas visitas do Bovespa que se formou o clube dos tenistas do Clube Pinheiros, um dos melhores de São Paulo, com o apoio e administração da corretora Geração Futura. “É uma poupança previdenciária”, diz Milton Miglione, da Geração. A principal vantagem em relação, por exemplo, a um plano de previdência privada é que o investidor tem total acesso a seu investimento o tempo todo.
Administração – Os participantes adquirem cotas do clube com a orientação de corretoras escolhidas pelos clientes numa lista da Bovespa. Definido o total do aporte inicial e a divisão das cotas, todos os participantes têm o direito de comprar novas cotas, desde que sua participação fique limitada, ao máximo, em 40% do total. O regulamento define que o administrador cobrará pela prestação de seus serviços uma taxa mensal, que pode variar de acordo com o valor do patrimônio do clube ao final de cada mês ou em função de um outro critério estabelecido no estatuto individual de cada clube. Como referência, a Bovespa sugere uma taxa mensal de administração de 2%. A taxa de corretagem, por sua vez, deve ser acertada entre as partes.
A carteira de investimentos é formada de acordo com o estatuto de
cada clube, mas deverá ter, no mínimo, 51% de seu portfólio aplicado
em ações. O restante poderá ser direcionado a ativos de renda fixa,
por exemplo. A aplicação dos recursos é feita pela corretora em parceria com o Conselho de Representantes – grupo formado por pelo menos
três membros eleitos para acompanhar o desempenho do clube, representar os interesses dos demais cotistas e compartilhar com
a administradora as decisões de aplicação dos recursos. A gestão compartilhada dos ativos tem como principal objetivo ensinar e envolver os participantes na tomada de decisões de investimento. A equipe da Bovespa cuida de encaminhar o grupo para a corretora que vai formar
e gerir – em parceria com os representantes escolhidos – a carteira de investimento do novo clube.
Pecúlio – Homero Amaral Júnior, da corretora Socopa, administradora do grupo Feng Shui e do Força 1, clube de investimentos formado por sindicalistas da Força Sindical, diz que ação é um pecúlio. E é exatamente assim que seus investidores a vêem. Ana Paula de Souza, da corretora Fair/AP, coordena um clube formado por tenistas do Clube Alto de Pinheiros. São 23 novos investidores que de dezembro a agosto tiveram uma rentabilidade de 70%. “Queremos que o trabalhador participe do capital acionário das empresas e vamos mostrar a todos que o investimento em ações é uma forma eficiente de poupança previdenciária no longo prazo. Juntos, os participantes terão as mesmas condições dos grandes investidores para comprar ou vender ações”, diz o presidente da Bovespa, Raymundo Magliano Filho.
Cuidado! Não vá com muita sede ao pote. A Bolsa pode disparar numa semana e despencar na outra e o investidor tem que ter paciência
e sangue frio para atravessar esse sobe-e-desce. Seu dinheiro pode
virar pó? “Isso é possível, mas é pouco provável”, diz Milton Miglione.
“A pessoa só tem que seguir aquele velho conselho de não colocar
todos os ovos no mesmo cesto.” Foi por aí que Warren Buffett, o
maior player de Wall Street, saiu de um investimento de US$ 10 mil
em 1956 e hoje tem uma fortuna em torno de US$ 36 bilhões. Ele
sempre comprou, nunca vendeu.