01/10/2003 - 10:00
Cenários talhados com esmero, núcleos ricos de personagens e, para alinhavar, uma escrita ritmada, sinfônica, isenta de hesitações e plena de recursos. Eis uma mistura para se produzir um bom romance. Eis aí também a exata combinação de fatores presentes em Concerto para paixão e desatino – romance de uma revolução brasileira (Francis, 350 págs., R$ 39), segundo romance do paraibano Moacir Japiassu. Escritor e jornalista com passagens por grandes veículos, entre eles ISTOÉ, Japiassu, 61 anos, sempre cultivou uma relação de proximidade e afeto com o vernáculo. Íntimo da língua pátria como um craque da bola, é dono de um dos grandes textos da sua geração. Neste Concerto, ele brilha e mostra maturidade. O pano de fundo é a Paraíba prestes a viver o assassinato de João Pessoa e a Revolução de 1930. O personagem principal é Isaías, figura de simplicidade comovente. Mas há espaço para mitos locais, como Juarez Távora, João Dantas e Agildo Barata. As homenagens chegam a Camões, mas sobretudo envolvem José Américo de Almeida, lendário político e escritor paraibano atuante na primeira metade do século, dono de oratória hipnotizante e mestre maior do autor.
É bonito ver Japiassu encadear frases e parágrafos. Um exemplo é o comentário, ainda numa advertência inicial, sobre o fato de os primeiros leitores terem achado que a melhor personagem do livro é mesmo a língua portuguesa. Há anos, Japiassu mantém uma coluna chamada Jornal da Imprença (sic). Nela, ele treme a pança de tanto rir das botinadas cometidas no dia-a-dia pelos colegas jornalistas. E o faz com elegância.