08/08/2007 - 10:00
Quinta-feira, 2 de agosto. Em Moscou o relógio cravava meiodia e oito minutos (cinco horas da manhã em Brasília) quando Anatoli Sagalevich, piloto do submarino russo Mir-1, pôs os olhos no inóspito e escuro “chão” do Oceano Ártico. Acionou um botão ao lado esquerdo do painel de comando. Imediatamente um dobradiço braço mecânico localizado na parte externa do submarino se esticou e fincou no solo marinho uma bandeira russa de um metro de altura – toda feita em titânio, capaz de resistir a séculos de corrosão. Nesse momento, a 4,3 quilômetro abaixo do nível do mar, o líder da expedição e vice-presidente da Câmara Baixa do Parlamento, Artur Chilingarov, um homem de voz rouca e frases curtas, soletrou: “O Ár-ti-co é rus-so”. O ato significou uma espécie de “troco” que estava entalado na garganta dos russos desde um certo 20 de julho de 1969 quando o astronauta americano Neil Armstrong escreveu seu nome na história do século XX ao cravar uma bandeira dos EUA no solo lunar. Assim como a corrida espacial, a corrida pelo petróleo é uma antiga e boa briga entre as grandes potências do mundo e representa o topo de uma pirâmide de controle sobre uma das fontes de energia mais usadas no planeta. Segundo o Departamento de Estatística dos EUA, todos os dias a Arábia Saudita extrai 10,7 milhões de barris de petróleo. Logo atrás vem a Rússia com uma produção diária de 9,6 milhões de barris. A partir dessa semana, no entanto, os especialistas terão de reorganizar essa planilha. Motivo: Moscou está com as mãos numa área com 10 bilhões de toneladas de petróleo e demais minerais, incluindo diamantes entre eles.
Segundo a Convenção da ONU sobre o Direito do Mar, cinco países com territórios dentro do Círculo Ártico (Rússia, EUA, Canadá, Noruega e Dinamarca) estão limitados a uma zona de controle econômico de 320 quilômetros ao longo de sua costa, mas desde 2001 a Rússia reivindica uma porção bem maior argumentando que o fundo do Oceano Ártico e a Sibéria são ligados através do mesmo fundo de mar continental. Essa alegação é baseada no argumento de que um tipo de relevo submerso, conhecido como Cordilheira de Lomonosov, é uma extensão de seu território. Para reclamar os seus direitos, os russos montaram e embarcaram numa expedição que um homem jamais imaginou que outro homem fosse capaz de fazê-lo: com os minisubmarinos Mir-1 e Mir-2 mergulharam até 4.300 metros de profundidade para recolher provas geológicas. Para se ter uma idéia da dimensão desse mergulho, a brasileira Petrobras, líder nesse tipo de exploração e dona de alta tecnologia, produz óleo a 1.853 metros – tirando petróleo a 2,77 quilômetros abaixo do nível do mar.
Para explorar o “ouro negro” a Rússia foi além: utilizou um navio movido à energia nuclear, cuja proa tem um formato que funciona como picador de gelo para abrir um buraco no Pólo Norte e “desovar” os seus minisubmarinos. Mas a corrida ao pólo não é somente sua. Na disputa estão Dinamarca, Canadá, EUA e Noruega (pela parte da Groenlândia) pleiteando à ONU a mesma região — com os novos achados, porém, Moscou com certeza apresentará novamente a sua reivindicação em 2009. Canadá e Dinamarca têm o mesmo argumento dos russos: a cordilheira Lomonosov é extensão de seus territórios. Inconformados, os canadenses pretendem criar um fundo para mapear o leito do mar gastando US$ 7 bilhões para construir e operar oito navios de patrulha para defender “sua soberania”. Tudo pode e poderá ser feito, mas o fato é que os russos estão à frente dessa batalha geográfica – e por enquanto a estão ganhando no campo da tecnologia, o que corresponde a ganhar 25% da reserva mundial (intacta) de petróleo. Se a vencerem definitivamente, os EUA é que serão os seus melhores clientes com um consumo diário de 20 milhões de barris. Diplomaticamente, mas só diplomaticamente, os americanos em terra mandaram uma mensagem para os russos no mar: “Desejamos boa sorte a eles”, disse a portavoz do Departamento de Estado dos EUA, Leslie Phillips.