Em todo o planeta, o primeiro dia do ano é reservado para a confraternização universal. Na prática, porém, o que se observa, na maior parte dos países, são grandiosos festejos para comemorar a chegada de um novo ano, sem maiores preocupações com o que acontece do lado de lá de suas fronteiras. A chegada de 2005 foi diferente. O ano começou com todos os olhares voltados para a Ásia. Em Paris, pouco antes da meia-noite, as luzes da Cidade Luz se apagaram por alguns segundos. Em Copacabana, a tradicional queima de fogos foi antecedida por um minuto de silêncio em homenagem às vítimas do tsunami, que engoliu parte do litoral de uma dúzia de países e deixou cerca de 150 mil mortos. Manifestações semelhantes ocorreram nos cinco continentes, mas o verdadeiro espírito de confraternização universal se revelou nos dias que sucederam o réveillon. As imagens da catástrofe, transmitidas em tempo real pela internet e pelas redes de televisão, sensibilizaram o mundo. A reportagem que se encontra nestaedição mostra como pessoas anônimas de todo o planeta começaram a buscar
maneiras de enviar ajuda aos sobreviventes, o que resultou em um silencioso movimento, capaz de fazer autoridades governamentais e não-governamentais de diversos países assumir uma postura de extrema solidariedade, disponibilizando recursos e logística para que os donativos pudessem chegar às mãos dos necessitados nas regiões atingidas. Ações como essas podem efetivamente construir um mundo melhor.

As centenas de milhares de famílias atingidas pelo tsunami comoveram o mundo. Elas foram vítimas de uma tragédia da natureza, dessas que o homem não tem o poder de evitar. Pode, quando muito, minimizar seus efeitos. Há, no entanto,
outras tragédias que vitimam milhares de pessoas todos os anos. Não são fenômenos naturais, e sim produto do descaso do próprio homem. Mais de dois milhões de pessoas morrem anualmente vítimas de malária, mal que pode ser evitado com políticas públicas eficientes. Nas estradas brasileiras, apenas em 2004 morreram 6.190 pessoas, número maior do que o de mortos em quatro anos de rebelião em Gaza e na Cisjordânia (quase cinco mil pessoas). Boa parte dos acidentes nas estradas poderia ser evitada, como mostra nossa reportagem.
Se em torno dessas tragédias anunciadas as pessoas se solidarizarem e se mobilizarem, certamente também farão com que os governos evitem os tsunamis não provocados pela natureza.