Enquanto ainda engatinham os trabalhos da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Congresso que rastreia os US$ 30 bilhões enviados para o Exterior por intermédio do Banco do Estado do Paraná (Banestado), uma investigação semelhante – da Assembléia Legislativa do Paraná – deu passos importantes para desvendar o esquema da lavanderia. Os deputados paranaenses quebraram no início da semana o sigilo fiscal e bancário do ex-presidente do Banco Central Gustavo Franco e da ex-diretora de Fiscalização Teresa Grossi. Eles são acusados de adotar medidas que escancararam o duto das remessas irregulares para o Exterior. A CPI do Paraná conseguiu também acesso aos dados eletrônicos das transações efetuadas por doleiros e outros correntistas no biênio 1998/1999, na agência do Banestado de Nova York. Até agora, só eram conhecidas as transações de 1996 e 1997. Embora estejam ainda sob análise, os dados trazem revelações bombásticas.

Os documentos mostram, por exemplo, que, pelo mesmo esquema que alimentou os US$ 32 milhões das contas na Suíça de Rodrigo Silverinha e dos fiscais do Rio de Janeiro, foram enviados de 1997 a 1999 quase US$ 1 bilhão para o Exterior. A PF acredita que a dinheirama tem origem na corrupção ou no caixa 2 de empresários, funcionários públicos e figurões cariocas. Comandado pelo doleiro Dario Messer e pelos empresários Leandro Martins e Reinaldo Pitta, o esquema utilizava principalmente a conta 030.100.089 aberta em nome da Depolo Corporation no MTB Bank de Nova York. A mesma conta aparece nas agendas de compromisso de Pitta e Martins apreendidas pela PF. Nas anotações de Pitta e Martins – empresários do craque Ronaldo, da Inter de Milão –, Messer aparece como o responsável pela conta no MTB.

De acordo com os novos dados, aos quais ISTOÉ teve acesso, a PF identificou que, por uma rede de laranjas, os recursos eram enviados inicialmente para contas abertas no Banestado de Nova York por doleiros e por bancos brasileiros. De lá, seguiam para a Depolo Corporation, uma conta que transportava o dinheiro sujo para a Suíça e outros paraísos fiscais. A papelada comprova que o Discount Bank, banco suíço no qual Silverinha e os outros fiscais abriram contas, deixou rastros. No Brasil, o banco é representado pela Coplac, empresa de fachada do Rio que tem como acionista a offshore irlandesa Trading Investing. Nas transações,
Antônio Nanis Filho, um dos procuradores da empresa irlandesa no Brasil, aparece em 1998 como responsável por oito remessas para a conta da Depolo, que somam US$ 1,2 milhão. De acordo com a papelada, a
grana saía das contas 111-3 e 116-2, abertas pelo Banco Rural no Banestado de Nova York.

A base eletrônica de 1998 começa a desvendar como o dinheiro voltava para o País. No dia 24 de abril de 1998, por exemplo, US$ 496 mil migraram da conta da Depolo para o Banestado de Nova York. Pela internet, o dinheiro caiu em segundos numa agência do Banestado no Rio. O beneficiário da conta, Juscélio Nunes Vidal, ainda não foi localizado pela PF. A Depolo servia como uma conta de mão dupla: tanto levava quanto trazia dinheiro sujo para o País.

 

Milagre da multiplicação

O presidente da Assembléia Legislativa da Bahia, Carlos Ricardo Gaban (PFL), voltava de férias de Miami, no domingo 3, quando o avião sofreu trepidações por causa da chuva intensa em Salvador. Mas a tempestade pior estava em terra. Assim que desembarcou, Gaban soube que seu nome constava da lista de remessas ilegais de dólares via Banestado, entregue há uma semana pela Polícia Federal à CPI do Senado que investiga o escândalo. Curiosamente, os US$ 120 mil atribuídos a Gaban foram parar na conta 600577300 de um banco em Miami.

Gaban, escudeiro do carlismo na Bahia, nunca desmentiu que fosse o dono da bolada e sempre se orgulhou em dizer que vivia só do salário. Chegou a afirmar que explicaria tudo. “Apresentarei os documentos necessários a respeito da notícia publicada”, disse sobre a reportagem de ISTOÉ que mostrou a lista dos políticos sob a mira da CPI. Mas, na quarta-feira 6, reuniu os líderes da Assembléia baiana e adotou a lei do silêncio. Só fala quando receber informações oficiais da CPI. Com as esquivas de Gaban, a oposição fechou o tempo: os 25 deputados vão pedir a abertura de um processo de cassação, uma CPI e seu afastamento da presidência. “Ele não negou. É um caso de quebra de decoro”, opina o deputado Targino Machado (PMDB).

As declarações de renda de Gaban, às quais ISTOÉ teve acesso, omitem a origem e não registram o envio das verdinhas aos EUA entre outubro e novembro de 1996. Segundo a PF, foram duas remessas, uma de US$ 50 mil e outra de US$ 70 mil. Na época, o salário de um deputado na Bahia era de R$ 6 mil e vigorava a paridade entre o dólar e o real. Em 1997, Gaban declarou que tinha embaixo do colchão – “disponibilidade em espécie” – R$ 120 mil. Neste ano, recebeu R$ 72 mil, mas mesmo assim economizou os R$ 120 mil e contava com R$ 201 mil no Banco do Estado da Bahia.

As declarações de bens de Gaban são intrigantes. Em 1995,
ainda funcionário da Telebahia, ele tinha patrimônio franciscano. Declarou ter recebido 77,9 mil Ufirs (cerca de R$ 59 mil) da
Companhia Telefônica da Bahia e possuía duas casas e um
automóvel. A prosperidade o alcançou a partir de seu primeiro mandato. A declaração de renda de 2000 revela um enriquecimento invejável. Agora já são oito imóveis em Salvador e cinco automóveis luxuosos, além de depósitos e aplicações que somam R$ 1,4 milhão, contra os modestos R$ 300 mil em patrimônio do início da carreira política. Dá para se gabar.