05/08/2003 - 10:00
O médico paulistano Nilson Donadio, 67 anos, tem apenas uma filha, mas certamente terá dezenas de “netos”. Especializado em reprodução assistida, ele foi um dos pioneiros no País na aplicação da técnica de fertilização in vitro (Fiv) – conhecida como bebê de proveta. Hoje, comemora o nascimento, a cada ano, de 60 a 70 crianças geradas a partir do método, aplicado em sua clínica, em São Paulo. “Agora, estou esperando nascerem os filhos daqueles que foram os primeiros bebês de proveta”, conta. Apesar de satisfeito com os avanços obtidos pela ciência nos últimos anos na especialidade, Donadio está preocupado com os erros
frequentes nas indicações dos tratamentos. De acordo com ele,
muitas vezes opta-se pela Fiv quando poderiam ser adotados métodos mais simples – e baratos.
Na outra ponta, também há profissionais que insistem no uso de outras terapias, quando, de fato, seria preciso recorrer à fertilização in vitro.
“Há casos nos quais a Fiv seria indicada, mas não é feita, e há aqueles nos quais ela é aplicada, mas não é indicada”, critica.
Istoé – Quais os principais progressos obtidos desde o nascimento do primeiro bebê de proveta, há 25 anos?
Nilson Donadio – A manipulação do óvulo e do espermatozóide
hoje é mais simples. Conseguimos tratar homens com
pouquíssimos espermatozóides.
Istoé – Qual a eficácia da FIV hoje?
Donadio – Varia de 26% a 40%, dependendo do casal. Se a mulher for mais velha, por exemplo, a chance de sucesso diminui. Mas tem gente que fala em eficácia de 50%. Isso é uma piada.
Istoé – É por isso que o sr. diz que há propaganda
enganosa na especialidade?
Donadio – Há médicos e médicos. Há aqueles que compram a vulnerabilidade emocional do paciente. O casal quer um filho para ontem e, muitas vezes, se o médico não oferece a proveta, ele some do consultório. Então, o médico aceita isso e parte para a Fiv, quando talvez o problema pudesse ser solucionado com técnicas mais simples e mais baratas. E a chance de sucesso do método é de no máximo 40%, sendo que, em geral, é preciso fazer mais de uma tentativa. Isso às vezes não é bem explicado ao casal.
Istoé – Há, portanto, um exagero na indicação do método?
Donadio – Há, na verdade, alguns equívocos. Em média, de 100 casais inférteis, 20 precisariam fazer a Fiv para ter um filho. O restante é resolvido com outras técnicas, como a inseminação artificial ou a correção de distúrbio hormonal. Mas o que está acontecendo é que, embora exista 20% de indicação, só se aplica a Fiv em 5% dos casos, mas nos quais ela não é a saída certa.
Istoé – Então, faz-se menos do que deveria e ainda por cima nos casos nos quais ela não é indicada?
Donadio – Sim. Isso ocorre porque há dois problemas. Há o médico que tem os recursos para fazer o bebê de proveta e, por isso, não oferece outras opções. Ele está lá, com um laboratório ocioso, e fica ávido por atender o paciente. Então, aplica a técnica mesmo quando ela não deveria ser usada. E, por outro lado, há o profissional que não dispõe de estrutura para Fiv, mas, para não perder o paciente, insiste em tratamentos que sabe que não darão em nada. Segura em seu consultório um casal que deveria ser submetido à Fiv, mas, como ele não tem laboratório e também não quer perder o casal, indica terapias ineficazes.
Istoé – Diante disso, como escolher um bom médico e ter segurança de que o tratamento indicado está correto?
Donadio – Primeiro é preciso saber a causa do problema. E não se pode esquecer de investigar as condições de fertilidade do homem. O médico deve também dar a chance real de sucesso dos tratamentos. Bebê de proveta não pode ser uma panacéia. Só será isso quando a eficácia da técnica for de 80% por tentativa, mas ainda estamos longe disso.