30/07/2003 - 10:00
A indústria automobilística busca um rumo para sair da crise. O ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, Luiz Fernando Furlan, convocou, no início da noite de quinta-feira 24, uma reunião com todas as partes interessadas para a instalação do que batizou de “Fórum de Competitividade da Cadeia Automotiva”. O primeiro encontro está marcado para 1º de agosto e tem como missão encontrar saídas emergenciais para impedir a demissão de trabalhadores, facilitar o crédito para o consumidor e desencalhar os estoques das montadoras. Além disso, o grupo deverá debater medidas estruturais de longo prazo para a indústria. O fórum promete reviver os tempos da Câmara Setorial, experiência bem-sucedida do início dos anos 90 que resultou na criação do carro popular. Na época, governo, trabalhadores e montadoras conseguiram, depois de muito debate,
falar a mesma língua.
O desafio se repete agora. Medidas que já poderiam estar em voga,
como a renovação da frota e a redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), não são consensuais. A redução do IPI, por exemplo, esbarra no ministro da Fazenda, Antônio Palocci, que não quer nem pensar nessa possibilidade. No ano passado, um acordo emergencial que incluiu redução da carga tributária foi assinado e acabou salvando o ano. Hoje, um carro popular recolhe 28% de seu valor em IPI. Nos automóveis mais sofisticados, a parte do Leão chega a 43%.
Luiz Marinho, presidente da CUT e um dos principais negociadores da proposta da Modercarga, um projeto de renovação da frota de caminhões do País, lembra que o maior entrave para colocar em prática o projeto que aliviaria a atual crise é a própria indústria. Segundo ele, as montadoras não aceitam incluir as chamadas contrapartidas sociais, como a redução da jornada de trabalho, que estariam dentro de uma nova proposta de contrato coletivo de trabalho nacional para todo o setor. “O Modercarga está maduro”, diz Marinho.
A crise é forte. Dono de um parque industrial com capacidade para fabricar 3,2 milhões de veículos ao ano, o setor deve encerrar 2003 despejando apenas 1,3 milhão de unidades nas ruas. A queda em relação ao ano passado, se confirmada a previsão, será brutal: mais de 350 mil carros deixarão de ser manufaturados, por absoluta falta de compradores. Nem as exportações, que deram um bom salto nos últimos meses, conseguem compensar a depressão que abate o consumidor brasileiro. Os pátios das principais montadoras do País abrigam uma frota de 160 mil carros tinindo de novos.
O governo, até que Furlan resolvesse tomar a frente, vinha emitindo sinais difusos. Vários anúncios foram feitos – até o chamado “carro do trabalhador” chegou a ser prometido – sem que nenhum se concretizasse. “Anúncios desse tipo esfriam ainda mais o mercado”, diz José Carlos da Silveira Pinheiro Neto, executivo da General Motors (GM) e vice-presidente da Anfavea, a associação que reúne as montadoras.
“Estamos voltando ao tamanho que tínhamos dez anos atrás”,
constata o executivo. “Nosso grupo perde muito dinheiro no Brasil”,
disse o presidente mundial da Renault, que desistiu na semana passada de produzir um novo carro nas instalações do Paraná. A pressão que a indústria exerce sobre o governo cresceu na semana passada, com o anúncio de demissões em massa na Volkswagen e na GM, que acabaram não concretizadas.
Fantasma – As montadoras tentam minimizar a crise concedendo férias coletivas a seus empregados, reduzindo espontaneamente a jornada de trabalho e abrindo programas de demissão voluntária, os chamados PDVs. O fantasma dos cortes em massa, recorrente no setor, reapareceu na semana passada. A Volks anunciou que tem um excedente de 3.993 trabalhadores nas fábricas de São Bernardo do Campo e Taubaté (SP). Com um quadro de pessoal superior a 24 mil empregados, a montadora anunciou que pretende investir R$ 350 milhões em uma nova empresa – a Autovisão –, uma espécie de intermediária entre os trabalhadores excedentes e a rua. Como os funcionários da Volks de São Bernardo têm garantia de emprego até 2006, e os de Taubaté, até fevereiro de 2004, a notícia caiu como uma bomba.
“Eles transformaram uma notícia boa, da criação de uma nova empresa, em ruim, ao anunciar que pretendem demitir trabalhadores”, criticou Marinho, que, junto com os sindicalistas do ABC e Taubaté, conseguiu reverter as demissões. Depois da confusão, a montadora alemã chamou os empregados para conversar e adiou para meados de agosto a criação da empresa. Já a GM demitiu 450 empregados de sua planta em São José dos Campos (SP) na quarta-feira 23 e os readmitiu no dia seguinte, depois de uma reunião que varou a madrugada. Sem alternativa, o sindicato teve de aceitar o cancelamento dos contratos de trabalho dos readmitidos por até seis meses, período que ficarão em casa, recebendo 80% do salário. A volta deles às linhas de montagem depende, a partir de agora, do sucesso das conversas do Fórum de Competitividade.
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