04/03/2011 - 12:00
NA INTERNET
“Minha Mulher Não Deixa, Não” estourou no
YouTube antes de ganhar as ruas e as rádios
E ngraçada, ridícula, pegajosa. Esses adjetivos são comumente usados para classificar o mais novo “hit chiclete”, a música “Minha Mulher Não Deixa, Não”, do pernambucano Reginho, que fala de um marido dominado pela esposa ciumenta. A tosca composição estourou depois que foi parar no YouTube, no fim do ano passado. Curiosamente, nem o próprio autor apostava muito na canção. “Se antes desse sucesso eu tivesse a boa estrutura que tenho hoje, não seria essa música que eu escolheria para divulgar. Tenho melhores”, diz ele. Sorte, então, não ter tido: “Vou não, quero não, posso não” é o refrão que está na boca do povo neste Carnaval.
Reginho, que nasceu Reginaldo Alves da Silva, 39 anos, tem como marca o bom humor. Comprovou isso ao lançar uma versão contrária – “Minha Mulher Não Manda em Mim”, em que o marido vai sim, pode sim… – em pleno apogeu do hit, mas tem uma história triste. Segundo de cinco filhos, de família pobre, ele fugiu de casa aos 13 anos para acompanhar, como cantor, o circo que passara na sua cidade, Abreu e Lima. Quinze dias depois, foi achado pela mãe em Goiânia e voltou para a família, mas não largou a música. “Comecei a cantar em barzinhos. Minha mãe gostava mais do que do circo”, conta. Entre covers de José Augusto, Fábio Jr., Raul Seixas e até de artistas estrangeiros, arriscava composições próprias que ia compilando de forma caseira em CDs, vendidos a R$ 5. Em 2010, já no sexto CD, veio o sucesso “Minha Mulher Não Deixa, Não”.
O Nordeste saiu na frente. Antes que a música estourasse no Brasil, o fenômeno já corria solto na região. A professora e foliã Larissa Peres esteve em Aracaju em janeiro e ficou impressionada. “Todo mundo sabia a letra e dançava”, lembra ela, que achava que era um sucesso regional. Estava enganada. No desfile do bloco Fogo e Paixão, só de músicas bregas, no domingo 27, no Rio de Janeiro, foram tocadas apenas duas canções recentes. Uma delas, adivinhe, “Minha Mulher Não Deixa, Não”. “A gente queria tocar só os clássicos do brega. Mas essa já nasceu brega”, diz Alexandre Morand, organizador do bloco.
Assim como acontece com outros hits de verão (leia quadro), é difícil explicar o que faz com que uma música pegue. No caso, o estouro de “Minha Mulher Não Deixa, Não” se deu por vias alheias: um grupo de gaiatos fez um vídeo com a música, associada a uma dancinha de coreografia caseira, e jogou no YouTube. “Quando vi, tinha quase meio milhão de acessos”, lembra Reginho. Ele foi grato: os rapazes do vídeo foram contratados como dançarinos – luxo, aliás, que ele nunca tivera, bem como produtora, cenário para shows e cachês de até R$ 50 mil (valor que ele não confirma nem desmente).
O lado meio ridículo da canção explica em parte seu êxito. “Há essa coisa meio Tiririca na cultura brasileira, de exaltar a desqualificação”, diz o agitador cultural Perfeito Fortuna, organizador do Concurso de Marchinhas da Fundição Progresso, no Rio. De fato, a letra não prima pelo refinamento. Começa com um diálogo em que um sujeito pergunta a outro se ele quer beber e fumar, mas só escuta negativas. Até que ele pergunta: “Não quer por quê?” Daí vem o refrão, pegajoso: “Vou não, quero não, posso não, minha mulher não deixa não…” Há versos jocosos, como: “Ei, tem duas nêga/E aí, vamos arrastar?/No Shanadu a gente bota o bicho lá” (“Shanadu”, a título de esclarecimento, é um motel, e “bicho”… bem…). Junte-se a isso a simplicidade da estrutura musical – ritmo bem marcado, melodia previsível e nada de harmonias difíceis – e eis um hit com prazo de validade, provavelmente, até o Carnaval do ano que vem.
O fenômeno não demorou a encontrar divulgadores famosos, entre eles Ivete Sangalo, que já cantou a música em shows. “Meu marido adora”, diz, fazendo troça. Um dos maiores blocos do Rio, o Monobloco também aderiu: no fim de 2010, em uma das apresentações do grupo, a canção entrou no repertório. “A ideia era uma zoação. Mas funcionou bem”, conta Pedro Luís, um dos fundadores do bloco. A agenda de Reginho não parou nem mesmo após o acidente que matou seu baixista, na madrugada da quinta-feira 24, quando o ônibus em que eles estavam capotou. No dia seguinte, Reginho já estava no Rio para o lançamento da campanha do Ministério da Saúde pelo uso da camisinha no Carnaval. O slogan, claro, é uma versão modificada do seu sucesso. “Temos que trabalhar. Se a gente parasse, ia ser difícil pegar o bonde de novo.”