Nove entre dez pais de filhos adolescentes já devem ter se estressado, ao menos uma vez, com o tempo que os rebentos passam disputando partidas de videogame. O que eles podem não saber é que dominar o mundo dos jogos eletrônicos pode ser o passaporte para um futuro promissor. Com a proliferação de computadores, consoles e celulares, o mercado de entretenimento virou uma mina de ouro. O resultado é o aparecimento de carreiras voltadas para a produção de games, como design, música e criação de personagens virtuais.

Não há números exatos, mas estima-se que hoje no Brasil existam cerca de 30 empresas dedicadas ao desenvolvimento de jogos. “O grande mercado ainda é lá fora, mas os brasileiros estão se destacando entre os melhores”, diz Araken Leão, sócio da empresa BananaGames, responsável, entre outras coisas, pelas versões brasileiras dos jogos da Disney para computadores.

Para suprir esse mercado em expansão já surgiram alguns cursos específicos. Em 2003, a Universidade Anhembi-Morumbi (UAM), em São Paulo, inaugurou seu primeiro curso de graduação em design e planejamento de games, com 40 vagas. O objetivo é capacitar profissionais para criar jogos de estratégia, ação e simuladores online. O primeiro curso livre surgiu em 2002 no Centro Universitário Positivo, no Paraná, mas era indicado para programadores. A Pontifícia Universidade Católica (PUC) do Rio de Janeiro, o Senac de São Paulo e o Centro de Estudos e Sistemas Avançados do Recife (Cesar), ligado à Universidade Federal de Pernambuco, são outros pólos de formação de profissionais dos jogos.

A indústria mundial da diversão eletrônica faturou US$ 33 bilhões em 2003. No Brasil foram R$ 60 milhões. Para acompanhar a evolução crescente desse mercado, há um mês foi criada a Associação Brasileira das Desenvolvedoras de Jogos Eletrônicos (Abragames), que reúne profissionais de norte a sul. Uma de suas missões é produzir estatísticas. A outra, assessorar as empresas nacionais que desejem exportar.

Os brasileiros estão em linha com as últimas tendências, a dos games disputados em rede por vários jogadores. É o caso do Erinia, em que até mil internautas disputam a mesma partida e escolhem o personagem que desejam encarnar, entre feiticeiros e monstros. “É o jogador quem determina o rumo e o fim da história”, diz o consultor de desenvolvimento Fábio Binder, um dos sócios da Ignis Games. O enredo do Erinia não tem segredo: um mago que luta contra monstros terríveis se vê obrigado a abrir um portal para que os bons escapem para outro planeta. O game é o primeiro RPG brasileiro, espécie de jogo surgido na década de 1970 nos EUA. “É o jogo da moda e já o exportamos para a Alemanha”, comemora Binder.

A Jynx, do Recife, é outra que aposta nos alemães. Seu primogênito FutSim, um jogo online que simula uma partida de futebol, foi negociado com a China e a Alemanha. Agora, a empresa vai mostrar aos alemães a prévia de seu título de estratégia que copia a fórmula dos reality shows. No Ilha da Realidade, o jogador encarna um produtor de tevê obstinado por aumentar a audiência de seu programa. Assim, ele envolve os personagens em todo tipo de encrenca. Manipula a fofoqueira para que ela faça intrigas e estimula o rapaz tímido e estudioso, o famoso cdf, a conquistar a garota sarada da academia. “Os europeus estão abertos para os jogos brasileiros”, assegura Jeferson Valadares, um dos sócios da empresa.

O perfil dos jogadores muda, mas não na mesma velocidade. O público dominante dos cursos e empresas ainda é masculino, por pouco tempo. “Na Coréia, quase a metade dos jogadores são meninas entre 12 e 17 anos”, garante Binder. Na pernambucana Jynx, já se percebe o toque da designer Drussila Hollanda. Ela é a responsável por suavizar o visual dos cenários. Drussila mudou a cor e a disposição dos móveis na casa dos personagens do reality show virtual.

Outro indício dessa invasão é a participação de duas equipes femininas no Eletronic Sports World Cup, espécie de copa mundial dos games que acontece em Paris. A LadiesS.AMD, formada por cinco estudantes paulistas, vai enfrentar as coreanas no jogo Counter Strike, uma disputa sanguinária entre soldados e terroristas internacionais. O embate vai ser duro, mas pode ser o primeiro passo para que logo os jogos eletrônicos sejam comuns nas rodinhas de meninas.