27/02/2008 - 10:00
Quando dois ou mais tucanos ligados a Geraldo Alckmin estão reunidos, o governador paulista, José Serra (PSDB), é chamado de Dona Flor. Que fique muito claro: não se trata de uma referência pejorativa. A metáfora com a personagem de Jorge Amado, que desfilava pelas ruas de Salvador de braços dados com seus dois maridos – um de cada lado – tem um significado exclusivamente político. A não ser que consiga convencer o prefeito Gilberto Kassab (DEM) a abrir mão de postular a reeleição, Serra terá que entrar na disputa eleitoral paulistana com um candidato em cada braço. Respaldado em números de pesquisas pré-eleitorais, Alckmin decidiu que não atenderá aos apelos do governador e de Fernando Henrique Cardoso e irá disputar a Prefeitura de São Paulo. Já está inclusive montando sua estrutura de campanha. "É claro que a manutenção da aliança com o DEM é importante para o PSDB e para o País, mas essa parceria não precisa necessariamente ocorrer desde o primeiro turno da eleição municipal", tem dito Alckmin a interlocutores tanto do PSDB como do DEM. Não se trata, porém, de uma avaliação unânime. "Temos que buscar desde o início do processo eleitoral a manutenção da aliança. Isso se constrói com o tempo. Qualquer lançamento de candidatura precipitado pode representar uma perda irreparável", adverte Walter Feldman, secretário municipal de Esportes. "Se Alckmin e Kassab saírem candidatos, quem poderá se beneficiar é a ministra do Turismo, Marta Suplicy, possível candidata do PT", completa.
Instalado confortavelmente em um escritório na zona sul de São Paulo, Alckmin tem conversado uma vez por mês com o governador José Serra, a maior parte das vezes por telefone, e pelo menos uma vez por semana com o governador de Minas Gerais, Aécio Neves, principal entusiasta de sua candidatura no PSDB. O ex-governador divide sua agenda entre a medicina e a política. Como médico, além de dar aulas em três universidades (Metropolitana de Santos, Santo Amaro e São Caetano), tem ministrado sessões de acupuntura pelo SUS três vezes por semana. Como político, optou por não conceder entrevistas e, quando questionado em algum evento público sobre sua candidatura, adota uma postura mineira: "Essa é uma decisão que precisa ser conjunta e não uma manifestação de vontade pessoal", afirma. Trata- se, na verdade, de uma discrição com data marcada. No final de janeiro, Alckmin combinou com o presidente nacional do PSDB, senador Sérgio Guerra (PE), que a única concessão que fará diz respeito à data do anúncio oficial de sua candidatura. Em novembro do ano passado, ele planejava colocar a campanha nas ruas logo depois do Carnaval, mas concordou em adiar o anúncio para a primeira quinzena de abril. Até lá, Serra e FHC lideram a tentativa de costurar de alguma maneira a manutenção da aliança com o DEM ainda no primeiro turno. "Temos que pensar também em 2010 e a manutenção da aliança política com o DEM precisa necessariamente passar por 2010", diz Feldman. "Não vou correr o risco de ficar sem disputar a eleição municipal apenas em razão da promessa de vir a disputar o governo paulista em 2010. Se entregamos a Prefeitura de São Paulo para o PT, corremos o risco de criar um adversário muito difícil de ser batido daqui a dois anos", disse Alckmin a Serra há cerca de 15 dias.
Mais do que discursos ou frases de efeito, o exgovernador arregaçou as mangas. Tem corrido diversos diretórios do partido e procura mobilizar os militantes. Nesses encontros, diz que em 2006 poderia ter derrotado o presidente Lula na eleição presidencial, caso tivesse obtido mais seis pontos no primeiro turno. E afirma que esses pontos teriam sido viáveis caso o partido estivesse mais empenhado em sua campanha. Em uma sala vizinha a que costuma ocupar, há algumas caixas contendo adesivos com os dizeres "Alckmin 2008". Sobre sua mesa, ao lado de um notebook, Alckmin mantém uma agenda com um adesivo na capa. Trata-se de uma peça da campanha eleitoral de 1986, quando se elegeu deputado federal pelo PMDB. "Há mais de 20 anos conquisto votos. Tenho uma história", diz o ex-governador aos interlocutores, que têm a atenção despertada pelo antigo material publicitário.