07/02/2007 - 10:00
Você é daqueles que correm para a loja assim que um novo celular chega ao mercado, mesmo que o seu, também repleto de recursos, esteja novinho em folha? Fica angustiado quando sabe que um novo equipamento eletrônico foi lançado lá fora sem previsão de chegar ao Brasil? Troca de câmera digital a cada novo megapixel acrescentado a um lançamento? Está armando estratégias para conseguir o recém-anunciado iPhone, a maquininha dos sonhos da Apple que une telefone, computador e música em um único aparelho? Se você reúne a maior parte dessas características, tem os requisitos básicos para ser classificado de tecnomaníaco, cybermaníaco ou tecnólatra, entre outros neologismos empregados para definir os viciados em tecnologia.
Ainda não é possível precisar ao certo quantos eles são. Mas essa tribo parece crescer na mesma velocidade em que a inquieta indústria de informática despeja produtos no mercado. A cada novo lançamento inicia-se uma corrida angustiada, na qual o vencedor é aquele que primeiro colocar as mãos na novidade. O diretor administrativo Marco Paulo da Costa Bernardino, 37 anos, é o que se pode chamar de tecnomaníaco padrão. Ele talvez tenha sido um dos primeiros brasileiros a manipular um mouse. Em 1984, ele convenceu o pai a comprar um Apple 2 E. De lá para cá, sua obsessão por desktops, laptops, celulares, câmeras digitais, filmadoras e iPods só aumentou. Nesse universo eletrônico, os aparelhinhos de telefonia móvel são os que mais o fascinam. Paulo troca de celular a cada seis meses. E já faz planos para adquirir um iPhone, o objeto de desejo atual de dez entre dez obcecados por bibocas eletrônicas. “Sofro quando não tenho o melhor e o mais novo nas mãos. É como se faltasse um pedacinho de mim.”
Exagerados Danielle (à esq.) pressiona o noivo Ismael
para que ele gaste menos com aparelhos. Marco passou a lua-de-mel em Foz do Iguaçu só para fazer compras
no Paraguai
Sofrimento de tecnomaníaco não dói apenas na alma. Machuca também o bolso. Para se manter atualizado, Paulo vive pendurado no limite do cartão de crédito. No momento, paga as parcelas de uma tevê com tela LCD, um computador top de linha e um celular. Ele conta um episódio que revela até onde a loucura de um tecnólatra pode chegar. Sua lua-de-mel com a ex-mulher, Débora, foi em Foz do Iguaçu, na região da tríplice fronteira entre Brasil, Argentina e Paraguai. As imponentes cataratas não foram o motivo maior da visita dos recém-casados. “Fui até o Paraguai comprar um scanner de mão (equipamento utilizado no tratamento estético de fotografias) e uma impressora.”
O Paraguai divide com Miami, nos Estados Unidos, a condição de meca dos cybermaníacos. O analista de sistemas Ismael Antonio Nobre, 26 anos, sacolejou por mais de 15 horas num ônibus de São Paulo à Ciudad del Este, no lado paraguaio da Ponte da Amizade. Tudo para comprar um notebook modelo Turion de 1.8 gigabyte de memória, uma câmera digital ultramoderna e um aparelho de mp3. Nobre acha difícil controlar o impulso pelo novo. “Eu quero ser o primeiro a ter – e fico frustrado quando não consigo.” Apaixonado por fotografia, ele é um consumidor compulsivo de câmeras digitais. A cada quatro meses troca de modelo. O iPod, aparelho que armazena e reproduz músicas baixadas da internet, já foram três. Quem não anda muito satisfeita com as manias de Ismael é sua noiva, a estudante Danielle, 23 anos. A moça acha que o namorado gasta demais com as traquitanas. “Ela quer casar. Por isso acha que eu torro dinheiro demais. Mas não tem jeito. Eu adoro isso”, assume Nobre. Ele calcula ter gasto mais de R$ 8 mil com produtos digitais no ano passado.
Marco Paulo e Ismael Nobre podem não saber, mas apresentam sintomas típicos de alguém que pode sofrer de tecnodependência, um distúrbio caracterizado pela compulsão por novidades tecnológicas. Fenômeno dos tempos modernos, o tema vem merecendo a atenção de especialistas. Médico responsável pelo Programa de Dependências Não Químicas da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), o psicoterapeuta Aderbal Vieira Jr. recolhe casos de internautas que estabeleceram uma relação de dependência com a rede. Ele atesta que um viciado em internet pode não ser necessariamente um comprador compulsivo de produtos tecnológicos, mas deixa claro que alguns sintomas podem se interconectar. “Se esse consumo se tornar abusivo, com prejuízos financeiros, familiares, sociais ou profissionais, além da sensação de perda de controle da vontade, teremos então um distúrbio psíquico.” Na sua avaliação, a terapia psicodinâmica seria o tratamento mais indicado para a tecnodependência. O objetivo seria identificar as causas e motivações que levaram o paciente a assumir o comportamento. De toda a forma, a cura demanda tempo e dinheiro. Dois elementos absolutamente indispensáveis para um tecnomaníaco.