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Pouca gente sabe, mas existe uma polícia que policia a polícia. Ela é chamada de corregedoria e seus oficiais trabalham à paisana para investigar melhor a banda podre da corporação. Em Força-tarefa, seriado da Rede Globo que estreia na sexta-feira 16, as ideias e práticas desse setor da Polícia Militar serão defendidas pelo personagem Tenente Wilson, papel do ator Murilo Benício.

Ele é um profissional incorruptível, às voltas com dilemas éticos, por conta do rigor de seu caráter. A produção é mais uma aposta no filão da violência urbana que coroou filmes como Tropa de elite. Seu protagonista, Capitão Nascimento (Wagner Moura), que chamava os subordinatos por Zero Um, Zero Dois, etc., também tinha dramas de consciência. Mas a abordagem, agora, é "99% asfalto", como diz o diretor José Alvarenga Junior, deixando claro que o foco não é mais a favela.

A intenção da Globo era mesmo adaptar Tropa de elite para a televisão. Mas o projeto não foi adiante porque os produtores do filme decidiram fazer uma sequência da história policial. "Ficamos com um espaço para falar do tema e uma ótima ideia nas mãos", diz Alvarenga.

O mergulho nas angústias dos integrantes da corregedoria veio da imaginação do escritor Marçal Aquino, roteirista de filmes como O invasor, que divide a autoria de Força-tarefa com o escritor Fernando Bonassi, do filme Carandiru. Para quem acha que policial é um homem sem rosto, quase sempre perdido com uma arma na mão, a série vai oferecer material para uma nova reflexão.

Na preparação para o papel, Murilo Benício, uma espécie de capitão Zero Dois, disse que aprendeu que há mais policiais honestos do que desonestos. Mas só sabemos o que fazem os da banda podre. "Não é chapa branca. É ficção pura: entretenimento com espírito crítico", diz Aquino. O roteirista nunca havia feito trabalhos para a tevê e espera levar para a telinha o que chama de "levada de cinema". Isso vale tanto para uma linguagem mais ágil e menos repetitiva quanto para uma imagem de altíssima resolução. Nas gravações estão sendo usadas câmeras de cinema que produzem imagem em HDTV, ou seja, em alta definição, para a tevê digital.

A sofisticação, claro, encarece os custos. "O gênero policial é caro por definição. Para o projeto emplacar, tem de valer cada centavo", destaca Alvarenga, referindo-se às cenas de ação, com explosões, perseguições e efeitos especiais. De acordo com o diretor, cada episódio demora sete dias para ser gravado e chega a custar 300% a mais do que o similar das séries cômicas produzidas em estúdio.

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REUNIÃO DA CORREGEDORIA Hermila Guedes e Milton Golçalves (em pé) interpretam policiais da delegacia especial que combate a corrupção interna

Murilo Benício acredita que esse ritmo mais lento oferece a rara oportunidade de fazer um trabalho mais elaborado. "Novela é uma batalha contra o tempo porque há a preocupação para a entrega dos capítulos diários", diz. Vivendo um personagem que o diretor chama de "quixotesco", ele trabalha na corregedoria sob a chefia do Coronel Caetano, interpretado por Milton Gonçalves. São sete policiais ao todo na equipe, solucionando os crimes.

Cada episódio da série leva uma semana para ser gravado e custa 300% a mais que um similar de comédia feito em estúdio

A atriz Hermila Guedes (do filme O céu de Sueli) é a representante feminina da tropa. Apesar de abordar temas que fazem parte do cotidiano de todo brasileiro que vive em grandes cidades, os autores contam que evitaram o ponto de vista documental. Na construção da trama, apostaram em suas vivências pessoais em vez de pesquisas intensas. Para Bonassi, a cultura de um país impregna inclusive as formas de violência e é isso que eles procuram retratar. "A polícia é parte do problema e da solução no mundo inteiro. Falamos do nosso exemplo, para o bem e para o mal", diz. Isso significa ter personagens, histórias e até crimes com características tipicamente brasileiras.

Apesar desse gosto pela cor local, Força-tarefa chega num momento em que séries policiais americanas como CSI e 24 horas mobilizam fanáticos em todo o mundo. Para a professora do Instituto de Estudos de Televisão, do Rio de Janeiro, Fernanda Furquim, uma das hipóteses para a retomada dos investimentos das emissoras nacionais neste formato seria justamente o sucesso da concorrência estrangeira.

Sem opções voltadas para um público mais segmentado, elas estariam perdendo audiência para a tevê a cabo. E a queda do Ibope das telenovelas seria prova disso. "A tevê brasileira é protecionista em relação à novela e, por isso, ousa pouco", acredita. A aposta em uma série como Forçatarefa sinaliza que esse é um bom momento para mudanças.

Murilo Benício do lado da polícia

ISTOÉ – De que forma se preparou para viver um policial?

Murilo Benício – Tivemos algumas palestras com policiais do serviço reservado, a polícia que investiga a polícia, e fiz aulas de tiro para aprender a usar a arma como policial, pois dos trabalhos que fiz até agora este é o primeiro em que não estarei do lado dos bandidos.

ISTOÉ – Qual é a marca do Tenente Wilson?

Benício – A honestidade. Mesmo não ganhando tão bem, ele seria incapaz de compactuar com a corrupção. Ele não compra produtos piratas, não baixa música na internet, não aceita que a sua namorada compre uma bolsa falsificada.

ISTOÉ – Interpretar um policial mudou a visão que tinha sobre a polícia?

Benício – Sim. Descobri que tem muito mais policiais honestos que desonestos.

ISTOÉ – O Tenente Wilson é um novo Capitão Nascimento (protagonista de Tropa de elite)?

Benício – Não tem nada a ver uma coisa com a outra. O Capitão Nascimento é um soldado e o Tenente Wilson se preocupa muito mais com a investigação do que com o embate. A maior característica do Wilson é seguir as leis à risca. Ele jamais praticaria um ato de tortura, por exemplo

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