15/04/2009 - 10:00
DIVERSÃO E PROTESTO O Obelisco do Ibirapuera foi o ponto de encontro em São Paulo para a guerra de travesseiros (acima.) Em Paris, ciclistas saem na Bicicletada Pelada
AFETO GRÁTIS Grupo oferece carinho a estranhos no vão livre do Masp, em São Paulo, durante o "Dia do Abraço"
No início de abril foi uma batalha de travesseiros ao ar livre. Em março, o uso da energia elétrica foi interrompido. Semanas antes, bicicletas com ciclistas nus circularam pelas ruas das grandes cidades.
Os eventos aconteciam na mesma data e no mesmo instante, mas em países diferentes, como se parte da humanidade tivesse sincronizado a vontade de protestar ou de se divertir.
As temáticas das ações simultâneas são variadas e reúnem milhares de pessoas que se organizam por meio de blogs, do Twitter e de outras ferramentas online. A frequência cada vez maior dessas manifestações na agenda mundial, algumas com bandeiras assumidamente fúteis, tem recebido críticas dos que temem pelo esvaziamento de iniciativas e causas realmente importantes, principalmente as ligadas às questões ambientais. Mas especialistas afirmam que elas são irreversíveis. São reflexo da geração atual, permanentemente conectada e mais anárquica que as anteriores.
Foi por meio dessas tecnologias que se organizaram no sábado 4 os quase mil participantes da Pillow Fight (Guerra de Travesseiros) no Parque do Ibirapuera, em São Paulo. "Uma cidade em que vale a pena viver tem de ter sua própria guerra de travesseiros anual", explica o site mundial do evento. O diretor de filmes Fábio Yamaji, 34 anos, costuma frequentar as manifestações, sempre de câmera na mão. "O insólito atrai", diz ele.
"Tem gente que acha superficial, mas é esse tipo de evento que tira as pessoas de casa." Para Eugênio Trivinho, professor do departamento de semiótica da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), essas manifestações podem não ter o mesmo caráter das greves, mas também criam a sensação de pertencer a uma comunidade. "É impossível abandonar a política em si", afirma. "Na dinâmica da cidade, essa atmosfera está sempre presente."
APAGÃO CONSCIENTE Durante a Hora do Planeta, as pirâmides do Egito ficaram no escuro. O gesto quis chamar a atenção para as mudanças climáticas
Antenada com questões sociais e ambientais, a assessora de comunicação Evelyn Araripe, 23 anos, participou, no Brasil, do World Naked Bike Ride, ou Bicicletada Pelada, que aconteceu nos países do hemisfério sul, no mês passado. A ideia era expressar a sensação de estar nu diante da agressividade do trânsito. Em São Paulo reuniu cerca de 500 ativistas. "É uma manifestação comum em outros países", diz Evelyn. "Quando você está no coletivo, se torna muito mais visível."
Redes sociais virtuais, como Orkut, Facebook ou Couch Surfing, são fundamentais na disseminação dessas iniciativas. No mês passado, membros do Couch Surfing mobilizaram o Free Hugs (no Brasil, Dia do Abraço), em que os participantes oferecem afagos a estranhos, e engrossaram a massa de participantes da Pillow Fight. O estudante Ivan Beserra Baião Junior, 18 anos, esteve na Guerra de Travesseiros e na Hora do Planeta, cuja proposta era desligar todos os aparelhos elétricos durante uma hora, em 28 de março.
"Apaguei a luz do quarto, o computador e pedi para minha família não assistir à televisão." A Hora do Planeta, ao contrário da maioria das manifestações, foi engendrada por uma grande organização não governamental ambiental, a WWF. A adesão foi boa no Brasil: 113 cidades, 1,2 mil empresas e 500 instituições. "Atualmente as pessoas estão mais preocupadas em abraçar as causas do que em seguir quem as lidera", explica Regina Cavini, superintendente da WWF.
Esse tipo de manifestação é comum para a geração que se desiludiu com formas tradicionais de fazer política. "Não existe uma reivindicação, mas uma intervenção temporária no espaço público", diz o professor Trivinho. "Os problemas da vida moderna se multiplicaram de uma forma infernal e os grupos se fragmentaram." Outras ações de protesto, como o Dia Mundial sem Carro e o Dia sem Compras (leia quadro), estão programadas. Ocorre que uma característica dessas manifestações é o fato de não serem organizadas com muita antecedência. Outro reflexo das novas gerações.