11/08/2004 - 10:00
Poderosa, rica e elegante. Uma das mulheres mais influentes no mundo dos negócios, a americana Carly Fiorina deu trabalho à equipe que cuidou de sua segurança pessoal durante uma visita ao Brasil, na semana passada. Presidente mundial da HP, ela se acostumou a conviver sob holofotes desde que comandou o processo de compra da Compaq, na maior fusão da indústria de tecnologia, há três anos. Por isso mesmo, Carly inventou regras, e muitas restrições, para se deixar fotografar em público. Impensável um flagra enquanto ela devora o almoço, por exemplo. Em suas concorridas palestras pelo mundo, ela é vítima de seu próprio veneno: a proliferação das câmeras digitais, hoje embutidas também em boa parte dos telefones celulares. Não foi diferente na terça-feira 3, no auditório de um luxuoso hotel paulistano, onde a platéia reunia 200 empresários e mais de um terço do PIB nacional.
“A fotografia é o melhor exemplo do processo de transformação que vivemos, onde os objetos deixam de ser físicos para virar digitais, virtuais, portáteis e pessoais”, disse Carly. Desde que os computadores se espalharam pelas mesas de trabalho e a internet conectou todos a um mar de aparelhos eletrônicos, a informação digital passou a circular sem fronteiras, à velocidade da luz. Como resultado desse intenso fluxo de informações, houve uma profunda reorganização na forma de fazer negócios. O que surgiu não foi uma nova economia, como alguns analistas batizaram as empresas pontocom. Nasceu uma economia interconectada, coordenada por um sistema nervoso eletrônico, nas palavras do espanhol Manuel Castells, um dos principais pensadores do ciberespaço.
E é sob essa ótica que se pode analisar a vinda ao Brasil da presidente da HP, para um encontro com o presidente Lula. Na segunda-feira 2, a executiva entregou a Lula uma proposta de isenção fiscal e incentivos para as empresas nacionais investirem em infra-estrutura, em especial de telecomunicações, para poder disputar um lugar ao sol no competitivo mundo da tecnologia da informação.
Como tudo no universo digital, os números são superlativos. Há pelo menos um bilhão de internautas no mundo, e novas páginas eletrônicas surgem aos milhares, todos os dias. Algumas estatísticas dão conta de que até 2005, quatro em cada dez corporações internacionais planejam comprar serviços de tecnologia fora de seus países. Na ponta do lápis, significa a geração de três milhões de novos empregos potenciais. Só para se ter uma noção, o mercado brasileiro de tecnologia emprega cerca de 300 mil pessoas.
Não faltam críticos para duvidar da meta do governo Lula, de elevar para US$ 2 bilhões a pífia exportação de softwares e serviços digitais até 2007. Na atual sociedade digital, a informação transita de um país a outro por fibras ópticas, satélites e cabos telefônicos. E o comércio entre as nações dispensa logísticas complexas de distribuição, transporte e burocracia aduaneira. Na prática, significa que é possível gerenciar redes de computadores, desenvolver programas e operar centrais de relacionamento com clientes de qualquer lugar do mundo. Basta ter um computador e uma linha telefônica para se conectar à internet à beira-mar, na pescaria com a família, ou de pijama, na sala de casa.
Depois da bolha – Nem mesmo a brutal desvalorização das ações das empresas de internet, no início de 2000, conseguiu ofuscar a prosperidade dos empreendimentos pontocom. “A internet vive um momento de maturidade, assim como a indústria da aviação. O mercado de internet é de ponta e não devemos nada para ninguém”, diz Fernando Madeira, diretor-geral do Terra, um dos maiores portais do País.
O efeito mais perverso do estouro da bolha foi a descrença no processo de oferta pública de ações (IPO) na Bolsa de Valores. É através desse mecanismo que o mercado financeiro investe em empreendimentos eletrônicos. As empresas de capital de risco são particularmente interessadas em idéias originais como o site de buscas Google, que planeja lançar suas ações na Bolsa ainda neste mês. Como seus papéis estão cotados ao redor dos US$ 110, o Google desponta como uma das empresas mais valiosas do planeta, e pode chegar a US$ 36 bilhões. Soa mesmo estranho que as ações de uma página eletrônica de buscas possa render mais do que os papéis da cadeia de fast food McDonald’s, ou US$ 10 bilhões a mais do que a gigante montadora de carros General Motors.
Desde o estouro da bolha, porém, a internet cresce sem parar. No Brasil, o salto é impressionante. “Somos o oitavo país em número de servidores conectados à internet, estamos à frente da França”, comemora Sérgio Amadeu, presidente do Instituto Nacional de Tecnologia da Informação do governo federal. “O único problema é que esse acesso ainda se restringe à elite, a população carente não está inserida nessa revolução digital”, reconhece Amadeu. Estima-se que pouco mais de 10% dos brasileiros tenham acesso à rede mundial de computadores.