Ver muito tevê é um sinal de vida sedentária. Até aí, nenhuma novidade. Mas não é só isso. Para as crianças, exagerar no tempo despendido na frente da telinha pode representar a diferença entre ter peso normal e passar o resto da vida tentando vencer a obesidade. A conclusão é de um estudo publicado na semana passada pela Nature, uma das mais importantes revistas científicas do mundo. O trabalho, feito pela Universidade de Otago, na Nova Zelândia, avaliou o tempo que 1.037 jovens passaram em frente à televisão dos três aos quinze anos e o impacto desse hábito no ganho de peso. O maior número de horas passadas em frente à tevê está relacionado com o aumento do ganho de peso e, conseqüentemente, do indice de massa corporal (IMC). A medida é utilizada para indicar se a pessoa tem sobrepeso ou está obesa e é calculada dividindo-se o peso pela altura ao quadrado.

O trabalho mostra que, ao atingirem 26 anos, 41% dos jovens avaliados estavam com sobrepeso ou obesos. “Eram justamente aqueles que tinham passado mais horas diante da televisão quando crianças”, disse Robert Hancox, o coordenador do estudo, em entrevista a ISTOÉ. Conforme a Academia Americana de Pediatria, mais de duas horas diante da tevê já é considerado excesso. “O estudo revelou também que a correlação entre horas diante da tevê e ganho de peso é mais forte entre as garotas”, afirmou Hancox.

Constatações como as obtidas pelos neozelandeses são mundiais e podem ser observadas também no Brasil. “Um levantamento que fizemos mostrou que os jovens obesos assistem à tevê até cinco horas por dia”, explica a nutricionista Isa Cintra, chefe do Ambulatório do Adolescente da Universidade Federal de São Paulo.

Na prática, como pais e pediatras podem lidar com o problema? O pediatra Fábio Ancona Lopez, presidente do Departamento de Nutrologia da seccional São Paulo da Sociedade Brasileira de Pediatria, aconselha os pais a interferir. “Eles precisam colocar limites no tempo dedicado à tevê, ao vídeo e ao computador”, diz. Em casos mais graves, a redução deve ser feita aos poucos.

Crescimento – A estratégia de tirar os pequenos do sofá dá certo. Um trabalho
da Universidade de Stanford, nos EUA, mostrou que a redução para uma hora de
tevê por dia ajudou crianças a emagrecer. Além disso, a tevê deve ser encarada como um aspecto do problema. “A obesidade é resultado de uma associação de fatores genéticos e ambientais. Por isso é importante avaliar vários aspectos, entre eles o tempo que essas crianças ficam em frente à tevê”, diz o endocrinologista Walmir Coutinho, do Rio de Janeiro, vice-presidente da Federação Latino-Americana de Obesidade.

A expansão da epidemia de obesidade infantil é preocupante. Nos EUA, houve um crescimento de 66% no número de crianças obesas nos últimos 20 anos. No Brasil, no mesmo período, o aumento foi de 239%. “E esse crescimento se deu com maior intensidade entre as pessoas de menor poder aquisitivo”, diz Coutinho. É justamente a gravidade do problema que tem levado cada vez mais cientistas a investigar a questão. Muitas dessas pesquisas confirmam dados já conhecidos, mas outras revelam novas abordagens. “Um dos estudos mais recentes revelou que as crianças que possuem televisão no quarto têm o mesmo risco de se tornar obesas que crianças cujas mães apresentam excesso de peso”, conta Coutinho.