07/02/2007 - 10:00
Euforia Abraçado por antigos companheiros ao saber
da vitória, Arlindo Chinaglia terá agora de administrar
compromissos com o PT
e o PSDB
Por volta das nove horas da noite de quinta-feira 1º, tomou posse como presidente da Câmara dos Deputados um médico paulista de 58 anos, temperamento explosivo e por vezes mal-humorado, mas tido como leal com os amigos e com os compromissos que firma. Um político de uma corrente minoritária do PT, o Movimento PT, que acabou apadrinhado pelo grupo que domina o partido, o Campo Majoritário. Alguém que, como líder do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, esteve quase sempre no campo oposto ao do PSDB. Mas que venceu a disputa pela Câmara com o decisivo apoio dos dois tucanos favoritos para a sucessão presidencial de Lula em 2010, os governadores de São Paulo, José Serra, e de Minas Gerais, Aécio Neves. Para ganhar, ele teve de atropelar as pretensões de fiéis aliados de Lula e antigos companheiros, o PCdoB do ex-presidente Aldo Rebelo, que tentava a reeleição, e o PSB do deputado Ciro Gomes, que sonha também com a possibilidade de suceder Lula. Vencedor com apenas 18 votos de vantagem sobre Aldo Rebelo no segundo turno, Chinaglia terá agora a tarefa de conciliar todas essas contradições, colar os cacos da disputa e obter, no comando da Câmara, a unidade necessária para aprovar os projetos de interesse do governo e do País.
Como é que se fala mesmo o nome dele?”, indagou o noviço deputado Clodovil na véspera da eleição. “Ninguém sabe ao certo mesmo”, socorreu um repórter. Por três legislaturas, ele pouco se importou de ver seu nome ser dito como se lê: Xináglia. Agora, faz questão de demarcar a correta pronúncia do sobrenome de origem italiana: Quinália. Na verdade, a dúvida sobre o nome reflete o caráter reservado do novo presidente da Câmara, que nunca brigara antes pelos holofotes das tevês ou pelas manchetes de jornal. Uma timidez inversamente proporcional à capacidade de articulação que esse médico nascido na cidade de Serra Azul, em São Paulo, demonstrou para se eleger. A campanha cuja construção se iniciou no final do ano passado, há pouco mais de um mês, virou o favoritismo inicial de Aldo Rebelo, que tinha então a preferência explícita do presidente Lula para permanecer à frente da Câmara.
Jogadores Os derrotados Aldo e Fruet (à dir.) querem revanches. “O campeonato acabou de começar”, diz Aldo
Não é nada desprezível o poder agora nas mãos de Chinaglia. Dependerá fundamentalmente de sua atuação a liberação de 60% dos R$ 503 bilhões projetados pelo governo para fazer o País se desenvolver no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Ele ainda administrará um orçamento de R$ 3,4 bilhões para os gastos da própria Câmara. E torna-se o terceiro nome na linha da sucessão presidencial, atrás apenas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e do seu vice, José Alencar.
Chinaglia, com sua vitória, traz de volta ao centro do poder o comando paulista do PT. À frente, o ex-ministro José Dirceu, que muitos julgavam neutralizado pelos escândalos que atingiram o governo no ano passado. “É a volta dos que não foram”, brinca o deputado Paulo Bornhausen (PFL-SC). Preocupado em administrar tantos interesses, Chinaglia fez um gesto de conciliação logo após ser ungido ao cargo. “Tudo o que houve foi um momento de disputa, que agora acabou”, disse. “Agora, tudo deve voltar ao normal: quem é governo vai estar novamente junto, e quem é oposição estará do outro lado.” A reconciliação, porém, não será assim tão fácil. Minutos após saber da derrota, ainda em meio à comemoração dos vencedores, Aldo Rebelo foi alcançado por telefone pelo governador de Pernambuco, Eduardo Campos, do PSB. “E agora?”, perguntou o governador. “Isso foi o jogo preliminar, o campeonato acabou de começar”, respondeu Aldo. O que Aldo quis dizer é que o resultado marcará, entre os partidos que apóiam o governo, o início de uma briga que só terá desfecho nas eleições de 2010 – uma briga pelo poder no governo e pelos rumos da sucessão que colocou de um lado o PT e o PMDB e de outro o PSB e o PCdoB. Na prática, Lula terá de fazer duas negociações a cada votação. E cada grupo fará questão de demarcar suas diferenças. “Não sei não, mas, na minha cabeça, coalizão que se inicia com dois blocos não é bem coalizão; está mais para colisão”, diz o deputado José Eduardo Cardozo (PT-SP).
Para Lula, a eleição de Chinaglia guarda ainda a vantagem de ter contribuído para dividir a oposição. O novo presidente da Câmara costurou com setores do PSDB ligados aos governadores de São Paulo, José Serra, e de Minas, Aécio Neves, para obter os votos necessários à vitória. No primeiro turno, a quase totalidade desses tucanos votou em Gustavo Fruet (PSDB-PR). Foram 98 votos, que levaram a eleição para o segundo turno (no primeiro, Chinaglia ficou com 236 votos e Aldo, com 175). A maior parte desses eleitores de Fruet migrou para Aldo. Mas o acordo pilotado pelo líder do PSDB, Jutahy Magalhães (BA), garantiu os 25 votos de que Chinaglia precisava. Em troca, o PT entregou ao PSDB de Minas a vice-presidência da Câmara. E estabeleceu com Serra e Aécio um período de trégua nas Assembléias Legislativas dos dois Estados. Resta saber até quando essa paz armada irá durar.
Colaborou Rodrigo Rangel