A esta altura do campeonato, o tucano José Serra já poderia estar tirando as medidas para o terno da posse como presidente da República. Em vez disso, experimenta os momentos derradeiros de sua triste agonia, às vésperas de uma derrota que deve encerrar sua carreira política. No início da corrida presidencial, o tucano ainda equilibrava o jogo. A despeito do bom momento da economia e de toda a popularidade de Lula, Serra tinha um discurso que poderia ser convincente: o de que o Brasil pode fazer mais e melhor. Bastaria dizer que Lula foi um ótimo presidente, mas que ele, Serra, teria mais competência para enfrentar os grandes desafios do próximo mandato. Entre eles, o de modernizar a infraestrutura e tocar todos os projetos necessários para preparar o Brasil para a Copa de 2014 e a Olimpíada de 2016. A seu favor, Serra poderia apresentar sua experiência ­administrativa em São Paulo, que possui as melhores estradas do País e onde se construiu a maior obra viária da América Latina, o trecho sul do rodoanel, em tempo recorde.

Para persuadir os eleitores, o candidato tucano deveria também detalhar seus planos. Poderia dizer, por exemplo, que privatizaria os aeroportos por uma razão bastante simples: atualmente, administrados pelo setor público, eles não funcionam a contento. Sobre a economia, bastaria dizer que as sementes do atual ciclo de prosperidade foram plantadas por um de seus maiores aliados: o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Mas Serra preferiu escondê-lo. E permitiu que o PT transformasse em verdade duas mentiras: a de que o governo FHC foi um fiasco absoluto e a de que as privatizações causaram um grande mal ao País.

Um discurso coerente e racional, que Serra chegou a adotar no início da campanha, talvez não o levasse à vitória. Mas lhe daria ao menos um reconhecimento: o de ter conduzido uma campanha digna e honesta. No entanto, à medida que apareciam números desfavoráveis nas pesquisas, ele passou a recorrer a um sem-número de baixarias e a criar motivos para que até as pessoas propensas a votar nele decidissem rejeitá-lo. Serra reverberou escândalos de duvidosa credibilidade, introduziu temas como aborto e religião na campanha, hostilizou jornalistas enquanto se vendia como arauto da liberdade de expressão, fez promessas econômicas que não poderia cumprir e revelou que seu projeto consiste apenas na busca do poder pelo poder. Além disso, mostrou-se um candidato praticamente sem equipe – e com um vice que, em hipótese alguma, teria condições de assumir a Presidência.

No fim, Serra foi vítima da própria arrogância. Julgava-se tão preparado que acabará perdendo sua última chance para a candidata que desprezava e a quem definia como um poste.