De Pequim até Moscou, passando por Salvador, Recife e São Paulo, a rede de lanchonetes McDonald’s vende o mesmo sanduíche, sem variar o tempero ou o sabor. A sociedade contemporânea já se acostumou com isso, e se num primeiro momento a globalização tende a homogeneizar os costumes, deixando indivíduos e culturas cada vez mais parecidos, não é estranho que a reação a isso seja a afirmação da singularidade. Com o máximo de contundência possível.

A hipermodernidade, termo cunhado pelo filósofo francês Gilles Lipovetsky,
empurra o consumidor exigente para longe da produção em grande escala. E cria
um público que não se satisfaz em comprar só o produto de vanguarda, mas quer ser reconhecido como alguém à frente de seu tempo. Para isso deseja o raro, o produto de melhor qualidade e de design mais arrojado. Nem que tenha que
gastar o exorbitante.

Seguidores da seita regida pela máxima “qualidade não tem preço”, os audiófilos, segundo o consultor de áudio e vídeo Fernando Andrette, somam entre 3 e 4 milhões de pessoas no mundo. No Brasil, são 350 mil indivíduos que juram ter mais sensibilidade do que os seres humanos comuns. Para eles, a sensação de ouvir um concerto como se a orquestra estivesse na sala de casa vale o alto custo. Foi para atender a esse público que São Paulo sediou na semana passada o Hi Fi Show, que levou fanáticos e curiosos a apreciar as novidades em som e imagem. O inebriante espetáculo de luz e som deixava claro: ali estava a última geração de tevês e aparelhos de som. Muitos vão demorar para chegar ao Brasil.

“Para ouvir música, tem que ser assim. Se ouço num aparelho normal, presto mais atenção na distorção do que nos detalhes do som”, afirma o estudante de direito Luiz Fernando Coimbra, 23 anos. Ele é um exemplo do consumidor que procura se diferenciar a partir de suas escolhas de consumo. Emprestou ao evento seu carro, um Pólo 1.6 que passaria despercebido não fosse o fato de ter um sistema de som que custou o mesmo preço do veículo, cerca de R$ 30 mil. Fã de jazz, o estudante diz que o investimento compensa, já que passa duas horas por dia no trânsito. Seu equipamento é considerado o top de linha dos sons automotivos – é 20 vezes mais fiel que o original de fábrica.

“Quando você aguça seus sentidos, nunca mais consegue usar um equipamento comum”, diz o médico argentino Victor Mirol. É um caminho sem volta. “O fetiche do audiófilo é estar o mais próximo possível do real, ele precisa de um aparelho de som que lhe dê a sensação de estar numa sala de concerto”, diz Mirol.

Os produtos mais cobiçados do Hi Fi Show foram os monitores de plasma e de cristal líquido (LCD), os aparelhos de som multicanal e os projetores para home theater. A idéia de ter em casa uma sala de cinema atrai cada vez mais adeptos no Brasil. Pesquisa realizada pela Fundação Instituto de Administração da Universidade de São Paulo (FIA/USP) investigou os hábitos de quem frequenta cinemas e videolocadoras em São Paulo. E apontou que quatro em cada cinco entrevistados preferem ver filmes em casa, por segurança ou economia.

De mero acessório dos computadores, as telas planas que equipam os home theaters passaram a ser o pivô de uma briga que deve movimentar mais de US$ 60 bilhões, um crescimento de 40% em relação a 2003. O mercado dessas tevês promete ser o mais lucrativo setor da indústria de tecnologia. Os analistas estimam que cerca de 5% dos 180 milhões de aparelhos de tevê vendidos neste ano no mundo terão tela LCD ou de plasma. A principal consequência será a queda de preços, já que o custo de produção desse tipo de tela ainda é caro.

Se no Brasil a tendência de não sair de casa para se divertir se relaciona à violência e às questões financeiras, nos países do Hemisfério Norte a explicação é climática (leia quadro). Não por acaso, ali estão os principais produtores de equipamento audiovisual de altíssima fidelidade. No topo estão os EUA, seguidos pelo Reino Unido e depois pela Escandinávia, onde a produção cresce mais do que em qualquer outro canto do planeta. Em tempos de iguais, vale tudo para se diferenciar.