É curioso o destino de alguns monumentos que homenageiam figuras públicas. Quando regimes políticos caem, os ícones que personificam a velha ordem sofrem como se tivessem vida. Todos se lembram da derrubada daquela horrenda estátua do ditador Saddam Hussein pelos soldados americanos quando eles “tomaram” Bagdá, em 2003. Os mais velhos certamente se recordarão das gigantescas imagens de bronze de Vladimir Lênin – o líder da Revolução Bolchevique de 1917 – sendo retiradas de seus pedestais depois que a União Soviética virou pó em 1991. No Brasil, país cordial por natureza, não se tem notícia de ataques – exceto por vandalismo – sofridos por vultos ilustres inanimados. Antes, nota-se até uma excessiva reverência a eles. Nos anos 70, um jornalista chegou a ser preso pelo Exército depois de ironizar, numa crônica, uma estátua eqüestre do Duque de Caixas.

Agora, o governador da Bahia, Jaques Wagner, provocou a ira do senador Antônio Carlos Magalhães ao retirar a guarda da PM do memorial de seu filho, o ex-deputado Luís Eduardo Magalhães, morto em 1998. A família de ACM já providenciou a contratação de seguranças particulares para fazer a vigilância do monumento, que abriga uma estátua e (acredite) o coração do ex-deputado.

A representação de personagens ilustres através de estátuas é comum a países de diversas culturas, embora hoje isso possa ser considerado démodé, quando não de gosto duvidoso, como atestam as imagens do Borba Gato em São Paulo e a do Padre Cícero em Juazeiro (CE). No caso do memorial de Luís Eduardo, o que está em jogo não é uma questão estética. Oxalá a retirada da PM (instituição pública) de um monumento (privado) não seja um ato de revanchismo, mas o primeiro passo para substituir, na Bahia, a velha prática patrimonialista, cara às oligarquias, pelo espírito republicano.

Cláudio Camargo é Editorialista da Revista ISTOÉ