14/09/2005 - 10:00
Adolescentes desiludidos, descrentes dos políticos e decepcionados com o presidente Lula, mas que vêem na política uma atividade essencial para o País. Assim se mostraram os nove jovens cariocas que participaram do debate realizado por ISTOÉ sobre os desdobramentos da crise instalada no governo e no Congresso. Eles foram unânimes em apontar a saída para resolver os grandes problemas nacionais: a educação. “Sem isso, é fácil manipular o povo”, enfatiza Letícia Nunes, 14 anos. Para ela, está na escolaridade a diferença entre o desenvolvimento do minúsculo Japão, “que teria tudo para dar errado”, e do enorme Brasil, “que teria tudo para dar certo”. O aumento do nível educacional impediria que os políticos mal-intencionados continuassem a agir livremente. “Hoje, os candidatos prometem muito e o eleitor não sabe identificar quem é sincero ou não”, diz Adriano de Jesus, 15 anos. A mentira foi um dos defeitos mais citados no debate. Miguel Costa, 12 anos, lamenta que justamente os políticos com os discursos menos verdadeiros sejam maioria entre os vitoriosos nas urnas: “Parece que aqueles que não mentem não conseguem se eleger.”
Participaram do debate adolescentes de áreas e classes sociais diferentes. Adriano, Marina Melo, 13 anos, e Ana Carla Carvalho, 12, moram na favela do Vidigal, recanto de carência cravado na zona sul do Rio de Janeiro, e fazem parte do grupo de teatro Nós do Morro. Letícia, Miguel e Luiza de Almeida, 13 anos, também residem na zona sul e integram a classe média alta, que é característica da região. Jéssica Menezes, 15 anos, Ingrid Oliveira, 13, e Luiz Guilherme Silva, 12, moram na favela Vila Vintém, na zona oeste. Durante duas horas, em uma mesa do restaurante Barril 1800, eles discutiram na terça-feira 6 o presente e o futuro da política nacional. As maracutaias que engordam as contas dos parlamentares foram o assunto que mais despertou indignação. “Não concordo com esse negócio de mensalão, de pagar pelo voto. É corrupção”, posiciona-se Jéssica. “Vários políticos corruptos já foram apanhados, mas mesmo assim eles não deixam de fazer coisas erradas”, lamenta Marina. A sucessão de escândalos acaba por gerar uma desconfiança generalizada e os jovens demonstraram pouca esperança de que a honestidade passe a imperar na política. “É praticamente impossível uma pessoa subir e não desviar um centavinho. Só se o povo tomasse o poder”, diz Luiza.
Pela avaliação de todos, Lula não tem sido um bom presidente, tanto pela falta de um bom programa de governo quanto pela omissão nos episódios de corrupção. “É um bando de gente muito próxima envolvida nisso. Como é que ele não ia saber?”, questiona Letícia. Para Ingrid, Lula assumiu um comportamento inadequado. “Ele tem se comportado como um sonso”, critica. Apesar de dizer que não votaria no atual presidente, Ana Carla diz que não tem nada contra ele. “Deve estar sofrendo muito, querendo que esse problema todo seja resolvido.” Apesar das críticas, nenhum dos adolescentes defendeu o impeachment e houve quem desse razões claras para que Lula seja mantido. “O mandato dele já vai acabar e, além disso, eu não gosto do vice-presidente, José Alencar, que assume se ele sair”, explicou Miguel.
Letícia, Luiza, Jéssica e Ingrid têm acompanhado a crise pelos telejornais e pela internet. Ana Carla só vê o noticiário de tevê. Luiz Guilherme prefere programas
mais leves: “Não gosto de ver os telejornais porque é só notícia ruim”, alega.
Marina diz que não tem tempo para ler as notícias e Adriano explica que só agora passará a ficar atento à política, já que vai votar no ano que vem. Miguel não gosta
de acompanhar a política, mas tem se informado mais sobre o assunto nos
últimos meses, por conta da crise. Luiza sugere que a tevê promova a conscientização também através de programas tradicionalmente voltados para
o entretenimento. “O brasileiro tem o hábito de assistir à novela das oito. Podiam inserir ali boas idéias políticas. Muita coisa poderia melhorar”, sonha. A idéia de tentar transformar o País através da cultura tem a aprovação de Luiz Guilherme.
“A arte pode ajudar muito mais do que as pessoas irem para as ruas protestar”, acredita. Manifestações populares como passeatas, que em décadas passadas foram as principais formas de expressão da inquietude dos jovens, não são vistas pelos adolescentes como algo eficaz. Somente Adriano e Marina disseram que participariam de mobilizações desse tipo.
Esperança – Todos têm uma vaga visão sobre como a crise começou e mencionam as denúncias do deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ). A maioria dos jovens acredita que o País poderá melhorar depois das turbulências. “Acho que isso pode ajudar as pessoas a ficarem mais alertas”, avalia Jéssica. Alguns demonstraram preocupação de evitar novas maracutaias e pregam mudanças na legislação. “Lula chegou ao poder sem maioria no Congresso, não pôde fazer as leis para mudar o País. Pecisamos de uma reforma política”, defende Letícia. Os jovens que moram em favelas revelam uma grande decepção com o governo na área de segurança. “Tem muita gente roubando e matando e nada acontece”, reclama Marina, moradora do Vidigal, onde naquele dia começava mais um confronto entre facções de traficantes. “Quando minha mãe sai para trabalhar, fico preocupada com ela e ligo a toda hora para saber se está bem”, conta Ana Carla.
O sentimento de insegurança, porém, não é exclusividade de quem vive na favela. “Outro dia usei o celular para avisar meus pais que havia um tiroteio em Botafogo”, diz Miguel. O abandono da área da saúde e a falta de empregos foram outras reclamações marcantes. A desilusão com os políticos é tal que Luiza propõe o voto nulo nas próximas eleições. A idéia não conquistou os demais. “Tem que votar, nem que seja no menos ruim”, ponderou Letícia.