13/10/2004 - 10:00
Cercado pelo Ministério Público e pela Polícia Federal, Paulo Maluf (PP) terminou de forma melancólica sua participação na disputa pela Prefeitura de São Paulo. Amealhou apenas 734.580 votos, o pior desempenho em quase quatro décadas de vida pública. Pela primeira vez, ficou fora do segundo turno em seu reduto. Acompanhou, no entanto, o término da contagem dos votos com a ilusão de que o malufismo poderia dar seus últimos suspiros com algum glamour. Afinal, com 11,91% dos votos válidos, ele é alvo – ainda que velado – de disputa entre tucanos e petistas. Só que a gravação de conversas entre dois antigos aliados acaba de revelar que o malufismo chega a seu ocaso de forma patética e até mesmo hilariante. O teor das conversas ainda está sendo analisado pelo Ministério Público, mas não há dúvida de que trará dor de cabeça ao ex-prefeito. Ele vem sendo investigado há três anos devido a prováveis e vultosas remessas de recursos para o Exterior. Prestes a ter um desfecho, a apuração é feita pela Promotoria da Cidadania.
Já as gravações, cujos principais trechos são reproduzidos por ISTOÉ, são caso para o Gaeco, o Grupo de Atuação Especial e Repressão ao Crime Organizado. São duas conversas, uma de cerca de 18 minutos, outra de 19, entre o vereador João Brasil Vita, um malufista de primeira hora, e Armando Mellão, ex-presidente da Câmara dos Vereadores (1999-2000). Nelas, Brasil Vita estaria articulando para que Mellão negasse denúncias feitas contra Maluf, argumentando ter sido pago para mentir pelo candidato José Serra (PSDB). Em junho, em depoimento à Promotoria da Cidadania, Mellão acusou Maluf de desviar recursos do túnel Ayrton Senna e da avenida Águas Espraiadas (hoje Jornalista Roberto Marinho), em parceria com seu secretário de Obras, Reynaldo de Barros Filho.
Como se não bastassem os preâmbulos e termos usados na tentativa de negociata, os dois trocam impressões sobre uma extensa variedade de temas, que vão do valor de propinas aos diamantes que Maluf, “o homem de quase US$ 1 bilhão”, estaria comprando em Nova York, já “que o dólar estava sobrando”. No segundo encontro, falam até da prataria e da coleção de tapetes do ex-prefeito, apontada como uma das maiores do mundo. “A casa dele tem uns requintes de quem ganhou dinheiro mole, não é dinheiro suado”, comenta Brasil Vita. “Dinheiro suado é o meu. Quando comprei esse tapete persa aqui, eu sei quanto ele custou”, completa, em sua casa, onde aconteceram as conversas.
Quando a reportagem de ISTOÉ comunicou ter cópia das gravações, assistiu a reações diversas. O promotor José Reinaldo Carneiro, do Gaeco, preferiu não comentar o caso. “Como está sob investigação, não faremos nenhum juízo”, disse. Mellão, que já havia prestado depoimento ao promotor, assumiu ter feito as gravações (leia entrevista à pág. 33), com o objetivo de “limpar seu nome”. Maluf, através de sua assessoria, afirmou que Mellão “não tem a menor credibilidade” e será processado. Localizado por telefone, Brasil Vita disse estranhar o relato. “Não sei dessas conversas, não tenho condições de explicar nada.” Meia hora depois, ligou contando que havia sido notificado a depor no Gaeco na quarta-feira 13, mas ressaltou que ele é quem havia sido procurado por Mellão. “Eu não falei nada com o Paulo”, garantiu, referindo-se a Maluf. “Queria saber até aonde Mellão chegaria. Não houve ilícito porque a conversa não foi transmitida para ninguém.” Questionado sobre outras “minúcias”, como a compra de diamantes e a caixinha dos ônibus, o vereador disse que eram “só conversas”, “não tinha nada a ver”.
Depois de tantas inconfidências, o Ministério Público deverá se pronunciar e dizer se elas são ou não criminosas. Quanto aos políticos, resta saber se Serra e Marta Suplicy, a candidata petista, continuarão atrás de Maluf com o mesmo empenho. A polícia e os promotores certamente não mudarão de rumo. Tudo seria até cômico, se não fosse trágico.